"Viver com medo é viver pela metade."

vivir con miedo es vivir a la mitad

Olga vivia as suas delicias da vida, o que o dinheiro pode comprar, da herança do marido que morreu recentemente, os filhos se afastaram, egoístas queriam que Olga se tornasse uma velha sem sentimentos, trancada em casa para cuidar dos netos? O marido, oficial da marinha, teve um avc aos cinquenta anos, ela ficou cuidando dele, como Olga era dez anos mais moça, sua vida havia se transformado se tornou uma enfermeira em tempo integral .Antes do derrame eles se divertiam, não que viviam muito bem ,afinal vinte anos de casados, sempre tem algumas arestas a aparar ,algo que se perde pelo caminho, mas ela se considerava feliz, nunca trabalhou ,o marido era ciumento, sua vida era só cozinhar, passar e arrumar, levava os dois filhos para escola ,depois fazia um curso de espanhol, ginástica, e, no natal viajavam .Sempre teve uma empregada domestica, nunca foi de fazer muita força para agradar filhos e marido , não era mãe dedicada, de fazer carinho nos filhos. Tinha sua rotina, amava a sua rotina, que ajudava mantendo Olga em movimento e não parava pensar na vida ,em bobagem, somente um dia pensou em sumir ,deixar tudo .Quando o Marido morreu ,ela estava com sessenta anos, já tinha um amante, Valdo, um bonito homem negro que conheceu na ginástica que faziam na praia, ele já estava aposentado ,amou Valdo a primeira vista .Isso parece um crime? Amar aos sessenta anos? Ter um amante, mesmo que o marido esteja inválido na cama, o velho já não falava, e respirava com a ajuda de aparelhos mantinha Olga refém vinte e quatro horas dia.

-Ele só quer o seu dinheiro? - dizia o filho mais moço, o primeiro a descobrir que Olga tinha um amante enquanto o pai encontrava-se na cama invalido.

-Você acha que ele não me ama, só porque sou velha e feia?

-Você tem idade para ser mãe dele. – Disse o filho, que depois não falou mais com Olga, já tinha um ano e ela morria de saudades das netas .A dor profunda que o filho causava a mãe, afastando as netas.

-Claro que não era só o dinheiro? Está bem e se for o dinheiro? - Olga já fazia sessões com um psicólogo desde adolescência ,quando o marido adoeceu ela trocou o profissional ,passou a ir em um psicólogo homem.

- Mais de vinte anos que vou ao psicólogo ,quem me curou foi o Valdo, quando ele chega na minha casa a minha boca enche de água e meu coração dispara, minha língua agarra ,isso é alguma coisa que eu nunca senti antes, será que eu não posso chamar isso de amor? – disse ao psicólogo.

-Você traiu meu pai - disse o filho mais velho quando Olga pagou a fiança de dez mil, o filho foi preso com contrabando, aquele dinheiro que seria do natal, Olga chorou sozinha.

-Não cospe em mim - ela virou o rosto para o filho - acabei de tirar você da cadeia, não joga essas coisas na minha cara,logo você que nunca foi um santo.

-Sessenta anos e ainda não sabe o que é vergonha? Os meus amigos fazem chacota de mim.

Olga teve vontade de falar que o filho mais novo era esquisito, quando era criança de colo ninguém queria pegar, chorava e espantava as pessoas, já quando criança quieta, antissocial, com vários problemas escolares, até abandonar a escola antes de terminar o ensino médio, adolescência atribulada, droga e prostituição, sentia admitir, mas seu filho mais velho é perdedor de nascença, nunca dera certo em nenhum emprego, péssimo para desempenhar qualquer função, nem mesmo tinha fama com as mulheres, era viciado em caça-níqueis e jogo de baralho.

Sua pressão subiu aquele dia, parou no ps chorando as magoas ao seu médico .Que adianta os médicos só sabem passar remédios, eles não sabem escutar.

Olga tinha uma amiga, já passava do setenta anos,escrevia poesia sobre Deus, estava surda por isso se tornara uma excelente ouvinte.Para olga falar todos os seus pecados, sem ter a necessidade de explicar nada. Quando a amiga falava, de tempos em tempos, entre a metralhadora de palavras de Olga, sua amiga declamava uma poesia falando de Deus, secretamente Olga não acreditava no Deus. As pessoas viam a divindade como um pai bom, um super-herói que resolve os seus problemas, em nada disso acreditava, era como os outros queriam ver a divindade, salvador ,que levaria para um lugar bom .Bobagem, quando chegamos a certa idade e a morte se aproxima, toda divindade parece boa .Para Olga Deus não existia e pronto

A conversa com a amiga sempre terminava com três imperativos:

Olga vai à igreja.

Olga para de fumar.

Olga larga esse homem que ele só está querendo o seu dinheiro.

Marlene, poetisa de Deus, quem escuta você não conhece o seu passado, bebia ,fumava, a conversão ao cristianismo foi depois do primeiro infarto, antes as duas viviam juntas ,o medo da morte acabou com a amiga de Olga, andava com dificuldade e já não era mais tão divertida.

Não sei por que ainda venho aqui? Deve ser porque não tenho para ela não me escuta.

Valdo valeria a pena ? Afinal perdeu os filhos, as netas e alguns amigos?

Sei Lá, acho que mesmo sem Valdo poderia perder, os idosos do asilo não perdem?

Hoje estava com raiva, Valdo obrigou Olga a comprar no seu cartão: geladeira, fogão e televisão, será que ele queria só o dinheiro? Esse fosse e dai?

A vida é feita de trocas, quem é que dá afeto sem receber nada em troca? Quando um homem de sessenta anos está com uma mulher de quarenta ninguém se incomoda. Alguém diz nas: ele é charmoso, não é? Mesmo com aquela barriga. Mulher não pode, mulher velha vivi em outro tempo é tratada por outras regras, Olga não pode ,ela não !Se estiver com um homem mais novo, ele só quer o dinheiro dela, aquele jovem está explorando a pobre da velha.

A senectude, nome bonito para a velhice, não afligia Olga, sabia da sua chegada inesperada, lutaria para viver do seu jeito até o ultimo dia, havia vivido com o marido, só foi infiel no ultimo ano, não que se arrependesse, nem achava a infidelidade um incrível ato de dignidade, ela sabia, é errado, o que podia fazer a vontade, o desejo, seu lado mulher falou mais alto que a razão, e agora até o fim da sua vida seria assim, escutaria o desejo.

Valdo estava com ela pelo dinheiro, ela estava com Valdo porque não tinha mais neném, além do mais achava o amante bonito e agradável na cama .Olga limpou a varanda do seu apartamento de frente para a praia.

Pensou:

Que bom, viver senectude, quando não se é covarde, um proverbio espanhol: vivir con miedo es vivir a la mitad .

JJ DE SOUZA
Enviado por JJ DE SOUZA em 03/10/2012
Reeditado em 03/10/2012
Código do texto: T3913476
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