Pagando promessa

Urucânia, na época um vilarejo pertencente à cidade de Ponte Nova, teve projeção nacional e internacional com a chegada do Padre Antônio Ribeiro, em fevereiro de 1947. Estava já alquebrado para a idade, mas com um grande ardor apostólico e considerado o taumaturgo que veio de Santo Antônio do Grama. Ele difundia, entre os milhares de romeiros, a devoção à Medalha Milagrosa, aconselhando sempre: “Amando a Mãe de Deus, as bênçãos e graças virão”. A imprensa direcionou seu trabalho para a pequena vila. A Rádio Nacional do Rio de Janeiro instalou-se num cômodo da casa da família Cohen. E não só a revista “O Cruzeiro” esteve presente, mas também a “Life’ e o jornal “The Times”. Na época, não havia a TV no Brasil e só muitos anos mais tarde, a TV Tupi fez morada no local.

Urucânia não tinha infraestrutura para enfrentar o “boom” de visitantes e os moradores precisaram se organizar para receber os milhares de fieis de todas as idades que chegavam de várias partes do Brasil para receber a bênção do padre, à espera de alcançar um milagre, como a cura de alguma doença.

Com a morte do padre, o número de romeiros diminuiu, mas na ocasião da novena um número incontável de devotos sobe a colina para assistir às celebrações eucarísticas e visitar o túmulo do Padre Antônio, que fica dentro do Santuário de Nossa Senhora das Graças. Todos vão pedir ou agradecer graças recebidas.

Zé Luís, morador de Ponte Nova, quando bem jovem, conheceu o Padre Antônio e a ele sempre recorreu em suas aflições. A gratidão por uma grande graça recebida leva-o a cada ano a Urucânia, no dia 27 de novembro. Ultimamente, já envelhecido, não mais consegue dirigir e seu amigo Raimundo é quem o acompanha para que cumpra a promessa feita, naquela longínqua década de cinquenta, porque fôra salvo de um grave acidente de caminhão.

Os romeiros chegam a cada minuto e Zé Luís, bem trôpego, tem medo de subir a colina no meio da multidão. É melhor que espere no carro e seu amigo leva a contribuição até ao altar da Virgem.

Raimundo abriu a porta do carro, pois o calor estava forte. Zé Luís colocou as pernas para o lado de fora. Segurava a bengala, a cabeça estava protegida pelo inseparável chapéu, já bem envelhecido.

Aquele mormaço foi amolecendo Zé Luís e ele chegou a cochilar por um bom tempo. A cabeça inclinou-se e o chapéu foi ao chão, caindo de copa para baixo.

O grande número de pessoas dificulta o acesso de Raimundo aos cofres da igreja. Finalmente, depositou a oferta de Zé Luís e, driblando a multidão, foi descendo a escadaria e, ao chegar ao carro, depara com o amigo dormindo sentado.

— Zé Luís, Zé Luís, veja seu chapéu caído ao chão!

E, surpreso, o pagador de promessas vê seu chapéu repleto de notas e moedas.

fernanda araujo
Enviado por fernanda araujo em 09/10/2012
Reeditado em 10/10/2012
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