Em paz com o passado dele

O filme "O casamento do meu melhor amigo", tem uma cena em que a noiva pára o elevador entre os andares e muito segura dirige-se à amiga claustrofóbica do noivo dizendo: "Ele colocou você num pedestal; e eu, nos braços dele". Assim, calma e confiante, ela encontrou serenidade ao entender a impossibilidade de competir com o passado do noivo e tratou de aproveitar o que a vida lhe oferecia: viver o presente e estar nos braços dele, sem neuras, cobranças ou inseguranças.

Perdemos muito tempo tentando competir ou apagar o passado das pessoas que amamos como se isso fosse garantia de comprometimento, vínculo ou afeto.

Como a mocinha do filme, devíamos nos aliar ao passado de quem amamos ao invés de brigar com ele. É muito difícil viver controlando, paranóicos, enciumados e inseguros com as memórias afetivas de alguém. Se ninguém tem controle sobre os próprios pensamentos, o que dirá dos pensamentos do outro?

Há de se entender que relembrar alguém é uma maneira de a gente localizar a si mesmo, trazer à tona nossa versão mais pura, ingênua... De vez em quando é bom, faz bem resgatar as coisas que prezamos de verdade.

Mas como encontrar serenidade quando existe um concorrente de peso na história dele? Simples: relaxando, acreditando no presente, deixando-o livre e entendendo que ele te escolheu. Escolheu VOCÊ, não o passado. O passado faz parte dele, mas não determina nem substitui o hoje. Ele vai visitá-lo de vez em quando porque a vida é complicada e ás vezes impõe dificuldades que nos obrigam a voltar.

Voltar para o lugar onde tínhamos certeza de quem éramos e o que queríamos. Voltar para o lugar onde amamos, fomos amados e por algum motivo desistimos de viver aquela história. Voltar para uma época em que decidimos trilhar outros caminhos até chegar onde estamos agora.

Temos a tendência de olhar prá trás com mais doçura, somos mais condescendentes conosco mesmos, de uma forma que não nos permitimos ser com o presente. Valorizamos nossas histórias como relíquias de uma época, como se o "tempo bom" não existisse mais. Mas isso tem nome: Ilusão.

Citando o poeta Rubem Alves, "saudade é nossa alma dizendo para onde ela quer voltar"... Mas tem que ser uma viagem com retorno garantido, pois permanecer preso ao que fomos e ao que deixamos partir é querer viajar lado à lado com o sofrimento, com a dor que acusa a ausência e os amores abstratos.

Não é pecado colocar o passado num pedestal desde que valorizemos nosso presente como um patrimônio real, palpável, a escolha que fizemos até o momento. Quem se acorrenta ao passado certamente não é feliz no presente, não está no lugar que escolheu estar, não conseguiu evoluir.

Relembrar é essencial para valorizar o presente, e quem tem medo que o outro faça essa viagem, pode estar perdendo a chance de estar nos braços dele.