DEPRESSÃO

A depressão pode ser entendida como uma tristeza que não tem fim, que não tem origem, que não tem uma cara. Pode ser entendida como sintoma, como melancolia, como morte. Passa-se o dia ao sol fixando na face um riso de escárnio numa aparência fáustica adquirida com muito exercício em prática comunitária. Mas à noite tudo se dissolve e o sol que agora ilumina o Japão não responde à pergunta: o que me faz tão vazio? O contrário também é verdadeiro. Cultivar a dor que a existência proporciona, naturalmente à todos, pode ser doença mas não tem o mesmo nome e, à noite, a pergunta é a mesma com uma diferença: o sol, mesmo distante, dialoga numa reflexão interminável que só faz retomar velhos mitos. Ali está Fausto diante da eternidade, Quixote armado frente ao moinho, o capitão Ahab com sua única perna e seu arpão na proa, jaco oferecendo lentilhas para Isau em troca do direito à primogenitura de Canaã. O sol retorna para a infelicidade geral e prosseguimos adquirindo novos aparelhos celulares, uns publicando novas respostas antigas perguntas e outros lendo manuais de auto ajuda. O que muda e o que permanece? O vazio. Porque o que existe entre os átomos, as moléculas e as estrelas é o vazio. Somos todos iguais.

Baltazar Gonçalves
Enviado por Baltazar Gonçalves em 21/10/2012
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