Salve, Jorge

Talvez pela íntima relação que tenho com o nome Jorge, mais íntimo que o santo; talvez porque a novela acaba de nascer, torna-se um tanto difícil abordá-la. Entretanto, pela Introdução é possível se formular uma ideia, obter um pequeno extrato da obra e esperar que nos acrescente alguma contribuição cultural. Corre-se sempre o risco de errar, mas errare humanum est.

Revestiu-se de considerável impacto o primeiro capítulo da novela Salve, Jorge. Além do impacto, a riqueza das cenas e dos detalhes, o forte e bem dosado colorido, as fardas em cena, os cavalos em sua imponência e impaciência, a demonstração de força de dois lados: o do poder das armas oficiais e o das armas do submundo uniformizado em farrapos. A realidade das favelas no Rio de Janeiro foi vista mais de perto, a tal ponto de causar a sensação de terror.

Aqueles policiais em seus cavalos ajaezados, brilhando ao sol da Cidade que já foi maravilhosa, fizeram reviver antigas cenas, digamos, do “Ancien regime” iniciado em 1964. Aqueles que um dia amedrontaram estudantes estão agora se tornando herois da pacificação das favelas cariocas. Isto é bom. Tomara mesmo que consigam reverter um quadro há muito consentido, o do desleixo a respeito das responsabilidades sociais ao longo de todos esses anos.

Nessa movimentação para tentar recuperar o tempo perdido e a ausência das políticas públicas, sabe-se, há violência e vítimas dos dois lados. Convém ressaltar que um mal crônico é de quase impossível cura. Mas, como brasileiros adoram milagres, resta alguma esperança. Novela, isto é, a arte, não resta dúvida, mata e ressuscita, casa ricos com pobres e doura muitas pílulas.

A pílula da atração sobre as fardas foi, em algum momento, inculcada no imaginário feminino. Muitos engalanados povoaram os corações românticos das moças, tanto por terra, quanto por mar e por ar. Aquele belo e envolvente senhor das armas dará muito o que falar e, em seus braços fortes, muitas de nós tornaremos a alimentar sonhos, c’est la vie.

O mesmo vale para a banda masculina no que se refere àquela loira, tão linda e poderosa em seus trajes antes nunca permitidos às mulheres, e sobre cuja cabeça a boina serve de coroa.

Enquanto o Rio de Janeiro estiver sob o abraço do Cristo, tudo lhe será permitido.