DIGNIDADE SE CONQUISTA

“Os seres humanos precisam de um senso de valor para atuar”

Jon Paulien – Reitor da Escola de Religião

da Universidade de Loma Linda, California/EUA

Um dia Gandhi teria dito: “Não sou cristão por causa dos cristãos; porque pregam uma coisa e fazem outra”. Receio que chegue o dia em que eu me sinta compelido a declarar: “não sou educador por causa dos educadores, porque pregam a mudança, mas não apresentam um projeto convincente para tanto”.

O atual estado de greve dos trabalhadores da Educação no Brasil dá uma dimensão da crise de valorização destes. No Amapá, a crise iniciada no âmbito trabalhista, tornou-se institucional e política.

O Governo, usando [e abusando] de todo o seu poderio institucional e midiático, iniciou uma campanha de difamação dos educadores com o intuito de constrangê-los, torná-los antipáticos à sociedade, impressionar o Poder Judiciário e, acima de tudo, intimidar os grevistas e, por fim, acabar com a resistência; resistência esta que sofreu um duro e covarde golpe quando, com o aval da Justiça amapaense, o GEA suspendeu pela metade os salários dos docentes e ainda descontou [da outra metade] os dias de paralisação após a decisão liminar que considerou abusivo o movimento.

A greve, que teve como bandeira principal o pagamento do piso salarial nacional do Magistério, acabou revelando outras facetas. Do meu diário de bordo, digo: de greve, destaco três. Primeira: a despeito de toda a maquinaria – incluindo o processo histórico-cultural, a formação profissional, condições de trabalho, etc. – que visa a alienação, o esbulho e o controle da ação pedagógica enquanto ato político, é possível se fazer ser notado, muito embora nem sempre ouvido e respeitado. A participação dos educadores de Laranjal do Jari, como nunca dantes, confirma isto. Segunda: a humilhante peregrinação dos educadores para obterem, na prática, um salário que, embora muito longe de ser considerado digno, por direito, lhes pertence, revela um problema mais grave que a simples relutância de governantes parvos em cumprirem disposições legais. Mostra, acima de tudo, que tais governantes – assim como o restante da sociedade – não dão ao educador o valor que este julga merecer porque sabem que o seu poder [do professor] de influenciar a sociedade e de determinar os rumos desta está longe de oferecer algum risco a quem tudo controla, o Estado e as elites capitalistas. Terceira: mais que salário, é necessário reivindicar respeito. E isso começa pela formação de uma nova consciência entre os educadores. Consciência esta que lhes permita enxergar a si mesmos como sujeitos e não objetos das situações; que os faça compreender que tipo de sujeito o seu tempo exige e que, acima de tudo, os induza a formulação de um novo projeto docente, com novas nuanças, novos paradigmas e que não venha desacompanhado de um sólido e bem elaborado projeto político que, sem sincretismos ou falsa modéstia, propugne pela conquista do poder – tanto no aspecto ideológico quanto no político-administrativo [por quê não?]. Sem isso, a tão evocada mudança continuará sendo o que sempre foi: no dizer do poeta: “Essa felicidade que supomos/árvore milagrosa que sonhamos/toda arriada de dourados pomos/existe sim; mas nós não n´a encontramos/porque está sempre apenas onde a pomos/e nunca a pomos onde nós estamos” (Vicente de Carvalho). Em outras palavras, direito não se pede, se exige; dignidade não se ganha, se conquista.