MULHER: SER ERRADO
Esse universo feminino. Formado de fragmentos de carmas e ordens coesos após vagarem anos na via láctea da solidão profunda, no pós big bang da insatisfação eterna. Sob esse passado, veio o mais pressionado ser terrestre, que algum autor preguiçoso alega ter partido de uma costela.
Mais convincente seria dizer que o tal Adão deu-lhe as vísceras -pois haja estômago!
A mulher do samba - enredo, do Gêneses, da costela, esses fakes mendicantes, em nada representam essa existência pesada que leva a mulher em seu cerne.
Nasceu errada. Logo, não dava status ter filho mulher. Se o primogênito fosse uma mulher , outrora, podia-se trocar de esposa (e disso se aproveitou Ana Bolena). Cresceu errada. Mulher, em alguma religião, se pode ter várias. Em outro mundo, se pode deformar-lhe o pé, diminui -lo. Aumentá-lhe o pescoço, cortá -lhe o clitóris. Se pode escolher -lhe o parceiro de uma vida, controlar o quando de seu hímen. Morrerá errada, a mulher. Ainda que obedeça a tudo. Ainda que não.
Nem subserviência, nem revolução. À mulher: a eterna, infindável construção da virtude em solo salubre.
E se estuda, se trabalha, se vence? E se cuida da casa, dos filhos, é religiosa? E se é divertida, independente, misteriosa? Não importa. É ser errado, ainda quando acertado.É errado, ainda que necessário. Ainda que perfeito.
Antes tivesse vindo do oco, do vácuo. Tudo seria lucro. Mas não. Tem que sangrar, e sentir, e padecer. Tem que carregar o fardo da madurez. Tem que parir! Tem de ser sábia como é e levar em si a complacência por um mundo que não a acompanha. E a paciência plácida para com sua própria natureza.
Sucumbir e morrer em vida enquanto viver. E buscar. Buscar sempre cercar-se de beleza, de sabores, a distrair - se do cerco julgador, da voz vinda de todos os lados: mulher, ser errado...
Daí pinta-se as unhas. Come-se um chocolate. Daí pensa-se numa distração e noutra, já que encarar sai caro. Fugir também, mas nem tanto. É só dinheiro.