Uma noite em apuros

Carlos Magno era ainda um bebê, quando foi criada, em 1964, a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Divinópolis. Crescendo em “graça e sabedoria”, chegou a hora dessa criança questionadora entrar para a escola e ser alfabetizada, formalmente, porque o alfabeto já sabia de cor e salteado. Mas uma coisa Carlos Magno não conseguia alcançar. Sempre que ouvia falar da FAFID, ele ficava confuso. Porque precisava de uma escola só para estudar as “letras” de Divinópolis?

Mais tarde, já Carlão, frequentou com regularidade minha casa, como um dos componentes, exímio flautista, da Banda Pégaso. Torcia para que o ensaio, que acontecia no barracão, no fundo de nossa casa, acabasse logo, porque eu preparava um lanche com rosquinhas de nata, bolo e biscoitos de polvilho. São passagens tão antigas e que o vento já levou, ficando só doces lembranças...

O tempo passou e Carlão foi morar em Belo Horizonte para trabalhar no Bradesco. Alojou-se, provisoriamente, numa pensão, e, na primeira semana, precisou chegar mais tarde, porque participara de uma confraternização acontecida no Banco. Não conhecia bem o regulamento da casa onde se hospedara e reparou com certa angústia que o portão já havia sido trancado. Ele ainda não recebera a chave e ficou um tempo a matutar... Como faria para resolver o impasse? Os quartos ficavam nos fundos da casa e gritar não seria educado, acordando a quem já estivesse nos braços de Morfeu.

Decidiu que o mais acertado seria pular o muro. Estava ainda nas tentativas e tudo daria muito certo se um policial que fazia a ronda não passasse por ali justamente naquela hora.

O guarda, certo de que se tratava de uma tentativa de assalto, já foi logo questionando o assustado rapaz. Com todo seu jeito correto de ser, Carlão disse toda a verdade ao policial. Era uma história meio difícil de ser aceita e não mereceu crédito de imediato. Mas um moço tão educado e de boa aparência merecia mesmo um voto de confiança. Aquela autoridade resolveu testá-lo e até, fazendo pé-pé, ajudou-o a escalar o muro com a recomendação de que ele voltasse logo trazendo a chave do portão como prova da veracidade de suas palavras.

Ao chegar ao aposento, Carlão tentou acordar o companheiro de quarto que tinha a chave. Ao dizer-lhe que o policial estava lá fora esperando, ouviu esta resposta:

— É, a festa estava boa mesmo, hein? Parece que alguém passou da medida. Da próxima vez, vê se me chama. E agora vai deitar que amanhã passa.

Carlão não pôde cumprir a promessa, mas, em compensação, sua pensão teve a proteção policial pelo resto daquela noite.

fernanda araujo
Enviado por fernanda araujo em 09/11/2012
Reeditado em 10/11/2012
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