Tem gente que tem eco

É no privè que a gente conhece de verdade as pessoas, ali onde ela não tem mais pra onde correr, quando não foge dos nossos olhares, é que ela se mostra nua, e sem apelos...

É nesse intervalo, que pode ser, só um instante, mas que ela se deixa flagrar pela conspiração das nossas perguntas combinadas...ou pelas nossas sutis demonstrações de entrega...

Quantas vezes nesse tète a tète o reflexo que volta é tão somente a imagem que produzimos...isso é na melhor das hipóteses...Mas e quando o outro é tão vazio que ao tentarmos algumas palavras, elas voltam com eco? É como se fizéssemos toc toc e o som fosse aquele oco que assusta pela certeza de que nada há dentro...

Aí, mermão, nem toda a lábia do mundo, faz com que a gente continue a sentir o mesmo interesse...nem que essa pessoa tenha muitos braços, nem que seja um poço de gentilezas... não tem jogo quando você fala e o outro só ouve, ou só repete o que aprendeu com você, ou pior; nem entende o que você diz...

Num encontro a dois a coisa pega, é aí no reservado que você conhece as palavras, os sentimentos, os defeitos e as qualidades das pessoas, é aí que se consolidam grandes amizades mas é aí também que se conhecem os grandes canalhas, os grandes babacas...

É tão gostoso quando a gente conversa com alguém e tem o prazer de ouvir coisas boas, de sentir que essa pessoa não é só uma casca bonitinha, e sem conteúdo nenhum. É tão gostoso sentir saudade de conversar com alguém que se conversa sempre, sentir saudade de alguém que quando se está junto parece que o dia fica mais interessante, alguém com que se pode falar de tudo, sem ter que medir palavras.

Compensador é conversar com pessoas que pensam, que sabem sorrir, que sabem falar e sabem ouvir. Terrível é falar com quem não formula um pensamento inteiro, que se arrasta em conversas sem nexo, que emendam uma fala na outra e parece que nada pra ela faz sentido, esse tipo de pessoa é capaz de engolir um caminhão e se engasgar com uma mosca...

Algumas coisas como esse preenchimento interno, não é só o tempo que dá, muitas pessoas chegam a maturidade e até a velhice ocas como um balaio vazio; enquanto outras nos surpreendem ainda na tenra idade, porque tem tanto a ofertar, pessoas que dão gosto de mergulhar na sua profundidade, porque tem águas envolventes.

Aí quando a gente compara, mesmo que sem querer, percebe que não importa muito o que tem dentro da carteira, ou o que aparenta, ou o quanto pode ser rodeada por A B ou C, porque o que está lá dentro de cada um não é o que a maioria procura, por isso o que está lá dentro só interessa mesmo a quem se preocupa consigo mesmo, com os ecos que não gostaria de produzir.

Esse é o grande diferencial de cada pessoa, e quando o eco do outro grita na nossa cara; tudo que ela possa ter construído até ali, desmorona irremediavelmente. E da mesma forma que há os cultuadores da aparência esteticamente correta, há os que garimpam a riqueza interna, pra esses, a essência é valiosa, e onde existe a consistência da essência, não sobram espaços vazios.

Angélica Teresa Faiz Almstadter
Enviado por Angélica Teresa Faiz Almstadter em 03/08/2005
Código do texto: T39836
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