GLÓRIA E LUXO EM PAOLO MALDINI

A estética do futebol definiu na gênese de sua pré-história: arte, genialidade e invenção são atributos exclusivos dos atacantes, dos meias. Com a força de um decreto real, foi estipulado que a função que cabe ao defensor é tentar destruir o espetáculo, adiar a apoteose, ser um desmancha-prazer. É um muro a ser abatido. Há glória e gozo quando um zagueiro é derrotado.

Ao defensor é permitido, e até louvado, que dê pontapé, que seja viril, que chute para o mato porque o jogo é de campeonato. Quem não tem habilidade é rebaixado para aquém da linha do meio-campo. É uma espécie de castigo divino jogar como zagueiro ou lateral, segundo o imaginário dos meninos. Ser defensor é ser resignado com seu destino.

Mas há os rebeldes, os desajustados. Como um farol em uma fortaleza sombria, há craques como o italiano Paolo Maldini, que fizeram de sua função de guardar o tesouro uma ode ao bom futebol. Dono de uma elegância que faz corar qualquer Giorgio Armani, Maldini desfilava talento em passarelas como San Siro, Santiago Bernabéu e outros tantos estádios. Roubava a bola com a graça e a autoridade de um Robin Hood. Nunca fez do ato de roubar um adversário uma atividade criminosa. O fazia como os bons ladrões: com sutileza, chuteiras de algodão, classe.

Considerado, com justiça inapelável, um dos maiores jogadores italianos em todos os tempos, Paolo Maldini vestiu em sua carreira apenas duas camisas: a do Milan, com 902 partidas, e a da seleção italiana, 126 vezes. Recordista em ambos. Disputou quatro copas do mundo (1990-1994-1998-2002). Foi vice-campeão em 1994, nos Estados Unidos.

A ausência de triunfos em copas, no entanto, não é suficiente para ofuscar sua vitoriosa carreira. Foi campeão italiano por 7 vezes. Por 5 oportunidade levantou a taça da Liga dos Campeões da Europa. Em 1995, foi considerado pela Fifa o segundo melhor jogador do mundo, uma glória para um defensor.

Bem articulado dentro e fora de campo, foi capitão do Milan e da seleção a maior parte dos jogos. Sua liderança nunca foi contestada. Ambidestro, era capaz de desarmar um Romário com a perna esquerda e armar um contra ataque com a perna direita, com a precisão de um arqueiro romano. Sua visão de jogo era tão boa com a bola dominada como, em guarda, para tomá-la do time adversário. Paolo Maldini não foi exatamente um gênio do futebol. Mas foi um gigante que mostrou ao mundo que é possível destruir os adversários com a força da elegância, que o luxo também pode ser latifúndio de um defensor.

Anderson Alcântara
Enviado por Anderson Alcântara em 26/11/2012
Reeditado em 27/11/2012
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