A vida é um palco

Texto que retorna após ter sido excluído por engano

Logo ao nascer, o que ao recém nascido aguarda é a expressão de felicidade estampada no rosto dos pais, o aconchego e o paparico no seio dos familiares e amigos. Mas a vinda a esse mundo não é apenas esse acontecimento mágico, esse milagre da vida que é o nascimento. Junto com a chegada do bebê, abrem-se as cortinas, inicia-se o espetáculo. A estréia da primeira cena é apenas o início dum atuar sem intervalo, que se estenderá por toda a vida.

Palco já todo iluminado, o ensaio durante o primeiro ano, se dará como o dos animais irracionais, engatinhando pelo chão vai o bebê, nada mais que o processo natural. Dali em diante, tudo parece fácil, tudo é bonito, a pureza e espontaneidade, tão próprias das crianças, faz delas seres alegres e felizes. Aliado a este seu jeito natural, está a ingenuidade e o sonho. Enquanto ainda ingênua, em Papai Noel acredita, que fadas e duendes existem. Estas características, devido às contingências da vida, aos poucos vão perdendo. O sonho, este não. Mesmo que a realidade começa a mostrar sua verdadeira face, o sonho permanece. O que se altera é que vai mudando de enfoque ao longo da vida. Lógico que nem todas as crianças sentem tudo fácil, principalmente as que em seus “lares” convivem com carências de toda ordem, e vêem que seus desejos e necessidades são difíceis ou impossíveis de serem realizados. Apesar desta estréia em desvantagem, de podermos perceber no semblante dessas crianças, a tristeza que do profundo do seu ser brota, o sonho e o desejo também existem. Para essas, talvez, o sonhar acordado seja a sua maior fortuna.

Com a chegada da adolescência, caminhos e encruzilhadas se estendem à sua frente, mas ao mesmo tempo em que o jovem vê um leque de opções se abrindo, percebe também que nem todas as portas se abrem com facilidade. Tudo uma questão de encontrar a chave, mas qualquer uma não serve, tem que ser a que combina com a fechadura. Ainda bem que existem as janelas! Mas enfim, começa a ver com mais clareza que o aprendizado deve ser encarado com responsabilidade. É então que durante esse processo de transformação (também de rebeldia, em muitos casos), que dúvidas e incertezas vão surgindo com mais intensidade. Mas por causa do vigor e exuberância que do jovem exala por todos os poros, e mesmo na ânsia para estrear a vida adulta, leva a maioria a imaginar que tudo já sabem. O que na realidade acontece, é que por falta de experiências, erros e acertos durante o desenrolar de suas vivências vão se sucedendo simultaneamente. O ideal é que ele próprio, baseado em suas aptidões, consiga visualizar o melhor caminho. Sem portanto, deixar de levar em consideração opiniões de quem já tem experiência de vida, em especial de seus pais. Lógico, não querendo generalizar, existe o jovem que, por ser sensato e já ter amadurecido, consegue seguir em frente sem grandes necessidades de reestruturar sua vida em anos vindouros.

Em dado momento, geralmente quando já amadurecidos, os homens param para analisar e reavaliar sua vida. O que resulta dessa avaliação, é que a maioria das pessoas se dá conta de que muita coisa foi ilusão. Maturidade adquirida, novas visões e leituras de mundo vão sendo gradativamente incorporadas ao seu viver. Isso significa que o natural processo evolutivo do mundo, não necessariamente vem em benefício de todas as pessoas. Devido a paradigmas e preconceitos estabelecidos pela sociedade na qual vivem, uma parte destes adultos tornam-se preconceituosos e cheios de si. Vêem o mundo evoluir à sua volta, mas mesmo assim não arredam pé da sua mentalidade ultrapassada. Estufam o peito sentindo-se a voz da razão, quando na verdade, só conseguem ver até onde a vista alcança, e mesmo assim, só vêem o que querem ver. Muitas vezes temos que saber ver por detrás dos montes, saber ler nas entrelinhas. Necessário se faz, não apenas olhar, mas olhar e enxergar. Observar com atenção. Mesmo aprendendo a vida inteira, continuamos sendo apenas um grão de areia.

Acreditando ou não em destino, com preconceito ou sem, a interpretação em cima do palco continua. Mesmo que o relógio da parede quebre, o do pulso pare, a vida real não pára. Os artistas do espetáculo da vida continuam atuando baseados em suas necessidades, convicções e desejos. Mesmo agora, com as marcas do tempo e os passos já mais lentos, o privilégio da cadeira de balanço é para poucos, muito poucos (no sentido de poder descansar, de desfrutar da velhice como melhor lhe convier). A maioria, mesmo os já “aposentados”, vêem-se obrigados a continuar trabalhando para poderem ter uma vida digna. Agora, além de continuarem desejando o melhor para seus filhos, o seu sonho estende-se mais além. Em meio às fotos desbotadas pelo tempo, em meio ao descanso ou lazer, ou da labuta que continua, os netos também ocupam o seu pensamento, o desejo de revê-los. Em meio à esperança que não se apaga, amores vão levando junto ao peito, as dores e injustiças querendo esquecer.

No brilho do palco, todos os gêneros são possíveis, até em brancas nuvens, vidas passarão. Quer queira quer não, o drama também ocupa o seu espaço. Além do drama e da tragédia, com poucas ou muitas lágrimas, além do sucesso e da vitória, com milhões de corações aflitos e preocupados, outros tantos, palpitantes de felicidade, não importa, o tempo insensível e alheio a todos e a tudo não passa, silenciosamente testemunhará a passagem das gerações. Quem passa somos nós. Com aplausos ou sem aplausos, a descida do palco mais cedo ou mais tarde de dará, é uma realidade comum a todos nós. Enquanto para uns apagam-se as luzes, fecham-se as cortinas, a representação em cima do palco continua. Com o ciclo da vida que se renova a cada instante, mais um bebê acaba de nascer. Em cima do palco, máscaras e mais máscaras estão sendo usadas. Uma especial para cada ocasião. Outras tantas, a um canto a esperar, para em cena entrar.