O primeiro dia - Flashes de Porto Seguro (3)
 
Tantas vezes fui em Porto Seguro que esqueci quantas. Não mais consigo relembra r o que aconteceu em qual viagem, mas os acontecimentos se mantêm vívidos, sensações mágicas de tempos encantados. Mesmo assim nada posso falar delas porque não as fixei em minha memória escrita. É por isso que de uns tempos para cá registro sempre alguma coisa – uma imagem, uma palavra senha, seja lá o que for - gatilho para não esquecer. É por isso que escrevo.
 
Antes de viajar em novembro de 2012 comprei um pequeno e grosso caderno, com a pretensão de registrar minhas viagens, de um dia que fosse. Estou agora folheando- o para colocar em dia as lembranças – usei exatamente dezessete páginas.
 
Hoje é o dia 15 de dezembro de 2012. O calor nos faz ter a sensação que o frio não existe, nunca existiu. Mas no dia 4 de novembro, dia em que viajei para a Bahia, começo anotando: Próxima viagem – seja lá para onde for. Não me esquecer de levar um xale. Estou sentindo frio, muito frio. Sim, ele existe, o Frio. Não é fruto de minha imaginação grelhada por este tempo quente que me parece eterno.
 
Sempre sonhei com uma viagem mágica através do tempo. Chegar antes de partir. Graças ao horário de verão isso quase aconteceu. Apenas cinco minutos de diferença. Uma hora perdida dentro daqueles aviõezinhos fretados para levar o grupo para a Bahia. Sempre penso quando viajo nesses vôos de classe econômica: agora sei o que a sardinha sente dentro da lata.Sem poder sair . Tenho opções? Sim. Posso me conformar, posso não viajar mais. Posso ganhar na Mega Sena e só viajar na Primeira Classe. Na verdade a opção é única. Conformidade. A segunda, não quero. A última, não depende de mim.
 
O primeiro dia passou rápido. Nesse dia, em 1985, meu pai morria. É muito tempo para ficar desesperada, pouco para sentir nostalgia. Acho que sempre sentirei. Embora previsível, foi daqueles dias que a gente pensa que nunca chegariam. Mas chegou. Eu havia acabado de chegar do trabalho, passava pelo corredor quando o telefone tocou e eu atendi. Era meu terceiro irmão. Ele estava lá, no hospital, ele e minha sétima irmã, sendo eu a primeira. Não me lembro das palavras que ele disse, mas sei que disse e eu me abalei. Suavemente fui caindo no corredor, ajoelhada, o telefone ainda no ouvido. Foi um dia longo, muito longo. E vinte e sete anos depois eu estava de férias em Porto Seguro. E não queria pensar nisso. E pensei só um pouquinho. A vida é um sopro, disse Oscar Niemeyer. A vida é um sopro.
 
 Ficamos hospedados em um bom Hotel. Netuno. O hotel não fica na Av. Principal. Sempre achei que todos os hotéis em que me hospedei anteriormente ficavam nessa avenida, da qual nem o nome sei. Não sei se tem um nome só ou muitos .Mas sei que assim que pisei no saguão tive a quase certeza de já haver me hospedado ali. Também em volta da piscina me revi assentada em uma mesa com amigos e na mesa vizinha uma família italiana. Que diferença isso pode fazer? Ainda é impossível voltar ao passado para conferir lembranças.
 
No quarto, duas camas king size para duas mulheres sozinhas. Achei um luxo só. Poderia dormir em qualquer direção, na horizontal e na vertical, poderia me hospedar só nessa cama que já estaria satisfeita. Isso absolutamente significa que o hotel fosse perfeito – fui enumerando as falhas, o que deixou muito aborrecida minha companheira de quarto que logo me rotulou.
 
Como sempre, a primeira vez que tomo banho em banheiro que não é o meu, apanho um bocado até acertar a temperatura da água e o volume do jato. Nesse hotel não foi diferente. E o pior: sem secador de cabelos. Confiante que um hotel razoável tem secador, não levei o meu. Minha companheira de quarto logo saiu procurando um para mim e logo achou. Ela sempre resolve os problemas, enquanto eu resmungo. Acho que é porque gosto de me bastar, sem precisar de ninguém, tanto que nem o usei – criei uma técnica para secar os cabelos do jeito que gosto – sem secador.
 
Minha amiga acha que eu reclamo de tudo enquanto ela resolve os problemas. Mas as minhas reclamações nem são em causa própria. Fico incomodada ao ver o quanto o brasileiro é displicente nessa questão de turismo. O Hotel é bonito e amplo, bastante arejado. Térreo e mais um andar. Logo tem escadas – sem corrimões e podem acreditar: eu não precisei deles para subir e descer – ela sim. Também no restaurante, com todas as qualidades possíveis, uma falha enorme, quando se sabe que é grande o percentual de diabéticos no Brasil e no mundo. Não havia alternativa, uma sobremesa diet, um iogurte, uma geléia.Quem fosse diabético que ficasse em casa, pareciam dizer. Os sucos não eram sucos, refrescos aguados. Frutas? Todas as vezes que tentei comer melão, estava verde e nem todos os dias tinha mamão e banana.Não costumo reclamar de comida, embora seja enjoada, não como qualquer coisa, por exemplo, peixes, sou fácil de contentar: um arroz com tomate me satisfaz. Ou arroz com couve. Sopa, qualquer sopa. Quando viajo por regiões marítimas sei que todo mundo quer comer peixe e acho normal isso. Anormal é não gostar de peixe. Mas não gosto.
 
Na piscina uma frase chamou a minha atenção – Piscina não vigiada – Proibido mergulhar de cabeça. Acho que entendi o que a frase quis dizer: Não pule de
Cabeça porque se um acidente acontecer não haverá ninguém para socorrê-lo.Mas se conheço a humanidade, do jeito que a frase estava escrita era um convite para que os engraçadinhos que existem em toda parte ousassem pular de cabeça, já que a piscina não era vigiada.
 
Porto Seguro. Gosto dessa cidade, mas mais uma vez repito. Essa foi a última vez que fui até lá. Tanto lugar no mundo para conhecer, não dá para ficar repetindo. E alguém chegando a esse ponto da leitura pode até pensar: mas o que afinal ela foi fazer lá se já tinha ido tantas vezes? Uma experiência completamente nova – um encontro nacional do que atualmente se chama de FELIZ IDADE. Mas isso  é conversa para outro papo.