Caso de Natal

- “Vocês não querem vir passar o Natal aqui?”

Foi rápida e objetiva a pergunta da minha sogra para o meu marido. De pronto, aceitei também. Deixaríamos de passar o Natal no Paraná, com a família do meu lado materno e passaríamos aquela data – a mais significativa – em São Paulo.

Sem problemas. Os abraços com a família da minha mãe ficariam para o Ano Novo.

E eu fui me envolvendo nos laços daquela expressão simples e alegre da família italiana de origem humilde. O dia 24 ao lado do fogão, no preparo animado das comidas , algumas invenções interessantes. As massas, os molhos, as carnes muito temperadas estavam a caminho da partilha. O aroma característico da fartura resplandecia pela casa com aquela alegria anunciada: junto da comida, virão os abraços, as fotos, as filmagens, o sorriso, os presentes e o interesse sincero de um pelo outro. O querer saber por uma questão pura de afinidade emocional.

O Aniversariante – o principal da História - se fazia presente no seu silêncio, apreciando todos aqueles abraços e conversas. Certamente apreciando também o intercâmbio amoroso entre as gerações: os mais velhos sendo ouvidos e respeitados, mas também sabendo entrar na brincadeira dos mais jovens. Os agregados sendo bem aceitos, sem nenhuma ressalva. Era sempre mais uma pessoa acolhida. O Aniversariante gostava sim de tudo isso e ficava feliz, com olhar brilhando insistente e intensamente, pois aquele encontro, a união e a convivência amorosa eram realizadas exclusivamente em Sua homenagem.

Mas o tempo resolve não esperar e o Aniversariante começou a chamar alguns para a Sua companhia, assim, bem mais perto, no aconchego do Eterno. Para nós, essas pessoas tão importantes, oportunas e interessantes ao nosso coração começaram a passar para o outro lado da Estrada. E foram indo, alguns sem nenhum anúncio; outros já demonstrando que era necessário partir para depois recomeçar.

O Aniversariante une mas também convida para o Seu banquete. Uma vez, o Padre Miron, um jesuíta de fina sensibilidade, me disse que “às vezes a pessoa fecha os olhos para ver melhor”. Acredito, sim, Padre Miron. Mas os nossos olhos se embaciam, rapidamente se amarguram no momento da despedida, a intensidade do som da festa arrefece... acho que o nosso coração tem que ficar mais atento para continuar sentindo.

Mas eu diria que o pior de tudo é que essa alegria, esse amor construído, não se repõe. As novas gerações têm pressa. Os ouvidos frequentemente falham quando o assunto é o amor às tradições. Os nossos familiares, tutti oriundi, sabiam perfeitamente que a união traria a sobrevivência, as festas ajudariam a enfrentar corajosamente as saudades do passado tão distante, os jovens seriam a grande esperança e seriam Iluminados pela História e pelo trabalho extenuante.

O contemporâneo fez coisas! O mundialmente respeitado líder religioso tibetano Dalai Lama explica, na sua extraordinária obra intitulada “Uma Ética para o Novo Milênio” algo em torno do enfraquecimento dos laços:

“A vida moderna está organizada de modo a exigir que a dependência direta dos outros seja a menor possível. A ambição mais ou menos universal parece ser todos terem sua própria casa, seu próprio carro ou o seu próprio computador para serem o mais independente que puderem... Também podemos assinalar a crescente autonomia de que as pessoas desfrutam em consequência dos avanços da ciência e tecnologia. De fato, hoje é possível sermos muito mais independentes dos outros do que em qualquer outra época. Porém, junto com esses progressos, surgiu a visão de que o futuro não depende de meu vizinho e sim do meu emprego... e isso, por sua vez, leva-nos a supor que , pelo fato de os outros não serem importantes para a minha felicidade, a felicidade deles passa a não ser importante para mim’”.

Mas a resistência é uma arte extraordinária e que contribui para nos mantermos felizes.

Que O Natal continue trazendo a união, a esperança, a renovação, os abraços calorosos e sinceros. Que junto do Aniversariante possamos convidar para Aquela Noite, além dos nossos queridos que ainda estão por aqui, os nossos tão amados que já partiram para o outro lado do Caminho.

Um excelente Natal para todos os meus amados,próximos e distantes e sobretudo luz e esperança para aqueles que se perderam no caminho.

P.S. Ainda bem que o ano não acabou. Rê rê. Assim teremos ainda inúmeras oportunidades para nos corrigir e viver melhor.

Vera Moratta
Enviado por Vera Moratta em 20/12/2012
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