O fim e o começo, por Martha Medeiros, na Revista O Globo de 30 de dezembro de 2012

Como era de se esperar, não teve fim de mundo. Mas 2012 não foi um ano qualquer. Muitas pessoas a minha volta sentiram algo pa­recido com o que senti: que este foi um ano de intensidade única, com uma energia capaz de encerrar etapas. Um ano de despedi­das, algumas concretas, outras mais sutis. Houve quem tenha ter­minado casos mal re­solvidos, quem tenha se conscientizado de um problema que não queria ver, quem se deu conta da fragi­lidade de uma situa­ção, quem tenha acei­tado um desafio que exigiu coragem, quem tenha enfrenta­do uma situação transformadora, quem tenha se jogado num estilo de vida di­ferente. Olho para os lados e vejo que 2012 não passou em bran­co para quase nin­guém. Pelo menos não para mim, nem para pessoas próxi­mas.
  Meu microcosmo não revela o universo inteiro, lógico. Você talvez não tenha per­cebido nada de inco­mum no ano que pas­sou, mas ainda assim seria interessante promover um fim ca­tegórico, encerrar o ano colocando uma pedra em algo que não lhe convém mais. Geralmente chegamos ao final de dezembro focados apenas no recomeço, na renovação, nos planos, sem nos darmos conta de que, para que nossas resoluções sejam cumpridas mais adiante, não basta pular sete ondas, comer lentilhas e outras mandingas. É preciso que haja, sim, o fim do mundo. O fim de um mundo seu, particular.
  Qual o mundo que você precisa exterminar da sua vida?
  Sugestão: o mundo do bullying cibernético. Ninguém é autênti­co por esculhambar o trabalho dos outros, sendo agressivo e mal-educado só porque tem a seu favor o anonimato na internet. Per­der horas na frente do computador demonstra sua total incapaci­dade de convívio. Bum! Fim desse mundo estreito.
  O mundo da prepotência, aquele que faz você pensar que todos lhe estenderão um tapete vermelho sem você precisar dar nada em troca. Qualquer um pode ser profético quanto a seu futuro: passará o resto da vida achando que nin­guém lhe dá o devido valor, isolado em sua torre de marfim.
  O mundo obcecado do amor doentio, aquele amor que só persiste pelo medo da solidão, e que de frustração em frustração vai minando sua pos­sibilidade de ser feliz de outro modo.
  O mundo das coisas sem importância. Quanta dedicação ao sobrenome do fulano, à conta bancária do sicrano, à vida amoro­sa da beltrana, o quanto ela pagou, o quanto ele deveu, quem reatou. Por cin­co minutos, vá lá. Os neurônios precisam descansar. Mas esse trelelé o dia inteiro, socorro.
  O mundo do imobi­lismo. Do aguardar sem se mover. Da es­pera passiva pelo mo­mento certo que nunca chega.
O ano de 2012 prenunciou um cataclismo, só que não era glo­bal, e sim individual. Impôs que cada um desse um fim à vida co­mo era antes e que promovesse uma mudança interna, profunda e renovadora. Feito?
  Então que venha um 2013 do outro mundo para todos nós.
 
Martha Medeiros
Enviado por Germino da Terra em 31/12/2012
Código do texto: T4061478
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