RECIPROCIDADE

DESCARTÁVEIS OU RECICLÁVEIS? COMO SABER?

MATERIAL DESCARTÁVEL

Para tudo existe uma explicação. Quando uma pessoa foi muito importante na nossa vida e, por algum motivo, sai dessa posição, torna-se algo inútil, dispensável. Muitas donas de casa fazem, vez por outra, um “bota fora” em casa por achar que estão acumulando coisas inúteis, desnecessárias. Valiosas às vezes, mas sem utilidade prática em casa. Às vezes roupas que não se quer mais usar atulham guarda-roupas, roubando precioso espaço, eletrodomésticos ainda em uso, mas que foram substituídos por outros mais modernos, bonitos e práticos, são guardados em armários e ali permanecem por meses ou mesmo anos sem que voltem ao uso. São peças valiosas, mas ultrapassadas e sem utilidade prática. Estão lá, mas ocupam espaço útil de forma inútil indicando, com isso, que seriam mais úteis se doados, usados para outras coisas ou até mesmo descartados, enfim, algumas coisas apesar de valiosas, são descartáveis. Não são mais importantes na mesma medida de antes. A presença ou a ausência desses objetos têm o mesmo peso. Já não fazem falta por terem sido substituídos.

Essa é uma simples alegoria. Compramos um objeto qualquer, eletrodoméstico ou roupa e nos emocionamos no momento em que os adquirimos. Passado algum tempo, porém, aquele objeto que tanto nos chamou a atenção perde o charme inicial e torna-se comum. Não chama mais a atenção. Não é mais tão importante.

O desejo humano natural é insaciável e estimula constantemente a busca por novidades que lhe satisfaça o senso consumista. Por sua vez, o novo, ao ser encontrado, torna o que ficou velho, descartável e o destitui da mente ávida pelo novo como algo importante, isso é natural e faz parte da seletiva natureza humana. Da mesma forma, aquilo que chega como o novo, não demora muito a perder o impacto despertado inicialmente e se torna comum também. É necessário entender que aquele elemento que foi considerado importante inicialmente, continuará sendo classificado como importante somente enquanto o interesse por ele for mantido. Isso é essencial para manter o objeto com a mesma importância inicial, mesmo assim ainda há fortes possibilidades desse interesse arrefecer quando se perceber que existe algo melhor que possa ser conquistado.

Algumas peças que adquirimos ao longo da vida, porém, são mantidas com muito carinho e, mesmo que não sejam tão úteis ou valiosas, nunca perdem o valor por possuírem alguma característica inerente que manteve despertado o interesse sobre si, seja pelo valor real intrínseco reconhecido no mercado, qual seja uma joia de ouro puro, brilhante e/ou outras gemas de valor que constituam valor patrimonial não sujeito a desgaste. Tanto é verdade o que afirmo que até hoje não consegui encontrar peças de ouro, diamante ou assemelhados desprezados nos depósitos de ferro velho visitados, e estou certo de que jamais vou encontrar. Este valor pode ser medido também pelo lado afetivo como presentes oriundos de pessoas de grande estima para nós, mesmo que não possuam valor patrimonial.

Existem objetos que não nos custaram absolutamente nada, que chegaram até nós através de pessoas que nos presentearam. Aquele objeto passa a ser valioso por representar a pessoa que nos presenteou tornando-se, em função disso, algo muito querido e de valor inestimável. Entretanto existem outras coisas que, ainda que nos tenham custado muito caro, perdem rapidamente o nosso interesse por elas, tornando-se obsoletas e incômodas. Além de passarem a ocupar inutilmente um espaço útil em nosso cotidiano terminando, desta forma, por se transformar em material inútil e descartável.

RECICLANDO AS EMOÇÕES E SENTIMENTOS

Os relacionamentos interpessoais podem, de certa forma, ser comparados com a relação que temos com nossos objetos pessoais. Desejamos que os objetos que compramos nos prestem um serviço de qualidade e por tempo prolongado, caso contrário, serão considerados inúteis e sujeitos a descarte. Da mesma forma precisamos ser assistidos em nossos sentimentos com atitudes de singeleza e espontaneidade por parte daqueles que se relacionam conosco, caso contrário, serão descartados por serem também considerados inúteis. Pessoas que fazem parte do nosso cotidiano têm que demonstrar a sua utilidade na relação que têm conosco por meio de atitudes que nos sejam aprazíveis. Pequenas atitudes e gestos de aceitação, por mais singelas que sejam, serão consideradas como pequenas e raras joias de ouro incrustadas de brilhantes que além de nos fazerem muito bem, manterão acesa a nossa atenção em relação a elas, caso contrário, o nosso interesse se perde e a relação torna-se comum e trivial, logo, sujeita a descarte.

Assim como temos obrigação de manifestar o nosso interesse por essas pessoas através de atos que as prenda a nós, cabe também a elas fazer alguma coisa no sentido de nos manter conquistados de igual forma. Esse não é um dever somente de uma parte, a outra parte também tem deveres que devem ser observados. O nome disso é reciprocidade. Não se trata de cumprir regras no sentido de atender satisfatoriamente a esses deveres, mas de se entregar à relação sem reservas. Se matarmos os sentimentos de uma pessoa em relação a nós com atitudes impróprias da nossa parte, seremos vítimas de nossas próprias atitudes. Por outro lado, nossos sentimentos também podem ser atingidos e mortos por posturas agressivas e despropositadas por parte daqueles que deveriam nos amar e respeitar.

Você já ouviu aquela expressão “mala sem alça”? É assim que o parceiro é visto depois que é transmutado em material descartável. Quando duas pessoas inteligentes descobrem-se nessa condição é porque está na hora de fazer alguma coisa. De mexer-se.