A descoberta do ouro

Provavelmente, se no quintal de minha casa eu descobrisse a existência de uma fonte de petróleo ou uma mina de ouro, esqueceria o significado da palavra trabalho. Dar-me-ia ao luxo de exercer o ócio como os filósofos gregos da antiguidade, que “pensavam na morte da bezerra” - enquanto seus escravos trabalhavam - e aproveitaria os anos que me restam desta efêmera vida gastando dinheiro com objetos supérfluos, carros, imóveis, doações filantrópicas, festas e viagens com meu amor.

Todavia, como minha vida não é uma cópia da família Buscapé, bem como o Brasil não se espelha no exemplo dos filmes norteamericanos, essa ideia fica apenas num sonho. Nesse país, até o que encontramos no subsolo de nossas propriedades não nos pertence, por vontade dos nossos constituintes de 1988. Fazer o quê?

No auge de minha juventude estou chegando à conclusão de que a fonte da riqueza talvez esteja mais ligada à sorte que ao trabalho duro e estudos, afinal, os noticiários comprovam esta tese. Recentemente, algumas manchetes de jornais instigaram minha curiosidade sobre esse assunto, então vejamos: 1) “Neymar fatura R$ 60 milhões em 2012”; 2) “Gisele Bündchen constrói patrimônio de R$ 2 bilhões”; e 3) “Faustão renova com a Globo com salário de R$ 5 milhões”. Pois é, parece mentira, mas essas não são notícias sensacionalistas, apenas um paradoxo da vida real de quase 200 milhões de brasileiros, dos quais uma boa parcela guarda o que sobra do almoço para comer no jantar.

Esses númerários quase não sei contar, e muito menos terei no banco em meu século de vida pretendido (se a violência e a medicina moderna permitirem). Lembro-me daqueles que acordam cedo, trabalham, estudam, dedicam tempo à família, ou seja, mártires que fazem mágica para alargar as vinte e quatro horas do dia sem o devido reconhecimento. A propósito: estatísticas já comprovaram que a grande maioria dos milionários de hoje não são estudiosos ou cientistas.

Concluí o pensamento da década: fazer uma graduação, mestrado, doutorado, pós-doutorado, uma descoberta científica ou escrever um livro vale menos que mostrar o talento na televisão (bunda, voz de radiola, cara bonitinha), as pernas secas na passarela ou as pernas-de-pau nos gramados; o importante é sair na foto. E quem paga o pato? Nós, espectadores que damos audiência, pagamos ingressos e enchemos os cofrinhos desses “pobres coitados” em nome da diversão e entretenimento; e o pior: é um mal necessário à nossa saúde mental.

Não menosprezo as conquistas materiais das figuras públicas que enriqueceram sem nenhuma contribuição relevante para a sociedade; afinal, quem sou eu para julgar o esforço pessoal de cada um. Porém – livre de qualquer viés político ou ideológico - não compactuo com a celebração da desigualdade social nessa proporção, e muito menos com a absorção conformista de tudo isso como integrante de um teatro vivo, em que nós somos meros personagens.

Gregor Samsa, na obra A Metamorfose, de Franz Kafka, acorda em determinado dia e percebe que virou um inseto gigante; essa lembrança me atordoou. Tive medo de acordar transformado numa barata, minha mãe me esmagar e eu não conseguir chegar no trabalho para, ao final do mês, receber o ganha-pão. Isso mesmo, chego a sentir-me um inseto para o mercado de trabalho quando lembro-me que alguém, que só sabe o que é um “o” porque vê na xícara, ganha num mês o que eu não ganharei na vida toda de trabalho. Mas a culpa não é deles, como dizem: “é do sistema”. Só espero que se algum dia eu acordar em forma de inseto, que seja um louva-a-deus, assim, já estarei na posição de oração e pedirei para ser artista.

Propaga-se que, para vencer na vida, é indispensável o trinômio sangue, suor e lágrimas; não necessariamente nessa ordem. Assim, creio que a descoberta do ouro está nessa assertiva, porque felicidade não é sinônimo de riqueza e conta bancária de prosperidade. Esse vil metal tão buscado, mas que causou derramamento de sangue em toda a história da humanidade, pode ser revestido de outra forma, e seu brilho observado em coisas muito mais simples e acessíveis aos nossos olhos, basta querermos enxergá-lo.

Robson Alves Costa

(17/01/2013)