GRITO RESSECADO

GRITO RESSECADO

Existem palavras que confortam numa hora de dor. Palavras que amenizam o sofrimento e a aflição de momentos difíceis que, em nossa vida conturbada, não são poucos. No entanto, sabemos que nada do que dissermos vai abrandar a mágoa dos familiares e amigos e de pessoas que direta ou indiretamente foram atingidas pela dor da perda de tantos jovens no acidente ocorrido na madrugada de 27 de janeiro, em Santa Maria.

Satisfatório seria fazer o tempo voltar para que antevendo a tragédia futura, esses pais impedissem seus filhos de sair de sob suas asas e assim nada tivesse acontecido. A rotina prosseguiria inalterável, os pais ainda poderiam acalorar seus filhos com abraços longos e infindáveis. Os sonhos poderiam ser atingidos. Infelizmente, não é possível. Seres pequenos que somos não temos todo esse poder.

Temos sim, outros poderes. Poderes, talvez, pequenos individualmente, mas que somados geram um grande poder. O do uníssono grito de Justiça, por exemplo. Grito preso na garganta. Grito que está se ressecando por nunca ter sido solto. Grito que por demasiado tempo confinado, encontra-se raquítico e amedrontado e perdido em algum lugar dentro de nós. Grito que se junta aos SE(s) que badalam ininterruptamente em nossas cabeças: Se houvesse outras saídas de emergência? Se não fizessem pirotecnia em lugares fechados? Se os responsáveis não fossem tão irresponsáveis? Se os extintores funcionassem? Se? Se? Se...

A falta de fiscalização e a corrupta conivência com os absurdos observados, revelam que o resultado desta calamidade poderia ser pior. E, lamentavelmente, enquanto nossa política de cuidado com a população for assim, outras tragédias virão. Pessoas perdem a vida porque outros recebem propinas. Pessoas morrem à espera de atendimento nos postos de saúde do Brasil afora, enquanto a verba destinada à Saúde é desviada. Idosos e crianças sem a devida atenção. Porque, na verdade, tudo se resume à falta de atenção.

Fiquemos atentos aos nossos prestadores de serviço que funcionam sem alvará. Aos restaurantes sem higiene, aos transportes coletivos sem manutenção ou condutor capacitado, às bárbaras condições das estradas. Fiquemos atentos se os familiares continuarão a receber assistência quando um outro escândalo vier (e virá) fazer com que a tragédia de Santa Maria caia no esquecimento.

Nossos sinceros pêsames e profundo sentimento aos enlutados. Que Deus possa de alguma forma ampará-los neste momento infundido de tristeza e melancolia. E que a sociedade tome este tenebroso acidente como exemplo e acorde de sua letargia, soltando assim o grito de liberdade, indignação e protesto. Grito este há muito preso na garganta.

Axills
Enviado por Axills em 30/01/2013
Reeditado em 30/01/2013
Código do texto: T4113005
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