Dias de Carnaval

Na minha rua, em Cordeirinho, Maricá, um garoto soltando pipa com uma linha azulada, devidamente “envidrada”. Que soltar pipa sem cerol é o mesmo que jogar pôquer sem ser a valer. Isso já deve ser normal há algum tempo. Mas levei uns vinte anos, talvez mais, pra ver uma linha azulada com cerol. Ou um “envidrado” azulado. No meu tempo... e aí, lá vem a droga do “meu tempo...”. Meu tempo p. n. (porra nenhuma, se você me permite).

Ele enrolando a linha em algo parecido com uma bobina. Grande pra caraca. Deviam caber uns 3 ou 4 déizão ali. Déizão = dez dos grandes, pra quem não sabe. Linha 10. Não dá pra comparar com o rolo que a gente tinha. Com um pedaço de vareta no carretel, aquela vareta de bambu que a gente usava pra armação da pipa. Às vezes a gente soltava pipa mesmo era com linha 24.

Carnaval. O samba corrido. Igualzinho a uma “parada militar”, na avaliação correta de um internauta. Nada a ver com Silas de Oliveira, Beto Sem Braço, Padeirinho ou com os caras que fizeram o belíssimo Chico Rei, do Salgueiro, entre eles Geraldo Babão. Na época tinha tempo pro Delegado e as suas evoluções suaves, de bailarino no céu. Agora, nem pro delegado de polícia. Mas tudo é normal. Como a linha azulada com cerol. Passo o dedo na linha do garoto. Cortante fininho. Pelo menos isso é como era no meu tempo. Lá vem essa merda de novo... Mas concluo que a vida é pra sorrir. Nunca pra lamentar. Enquanto a gente existir, inútil será reclamar.

E estamos por aqui. Aproveitando esses dias de Carnaval na praia, no sol. Enquanto ele não falta. Os garotos soltando pipa, na rua ou na praia. Os adultos curtindo um churrasco em casa, quem pode. Ou o sol da praia.

Pergunto-me se antes era assim. É inevitável a comparação. Parece que hoje todo mundo sai da cidade no período carnavalesco. Naquele tempo (essa droga de novo) parece que todo mundo ficava na cidade nos braços de Momo. As ruas cheias de blocos, que a gente chamava de sujo. As escolas de samba vinham até nossos bairros. Cordões de isolamento, certamente de sisal. Periculosidade quase que inexistente na área. Podia haver assaltos, mas nada que se comparasse ao que acontece hoje. Arrastão era palavra usada pra pescador ou na bela canção do Edu Lobo. A rapaziada podia curtir um baseado (fuminho, como diziam), mas não havia a figura endeusada do todo poderoso traficante. Muitos deles desfilando hoje ao lado de autoridades municipais. Numa promiscuidade também carnavalesca. Houve um tempo em que bagunceiros não eram necessariamente meliantes. Palavra que também já não se usa. Como galocha.

Mas deixa pra lá. É só pra lembrar. Pode depois esquecer.

Maricá, 09/02/2013

Aluizio Rezende
Enviado por Aluizio Rezende em 18/02/2013
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