A hipocrisia dos tetos de vidro

Tanto se fala a respeito de vigilância que muitas vezes vigiamos demais o alheio e desguarnecemos a nossa própria conduta. Não seria isso uma forma de hipocrisia? Mesmo que de forma involuntária, sem maldade? Ou será um comportamento nato, que sempre acompanhou a pessoa a ponto de apenas essa pessoa não perceber o que faz?

Tal comportamento assemelha-se a um vício e, como tal, vai carcomendo o físico, o psicológico e o espiritual, levando o dependente a um beco de difícil saída. Se adotarmos uma visão espiritualista (ou espírita) levantar-se-á a hipótese de uma obsessão. Ainda dentro desta visão, se há os obsessores, há também, e sem a menor sombra de dúvidas, aqueles que podem nos guiar rumo à luz do esclarecimento.

Infelizmente, no entanto, um vício só é resolvido satisfatória e plenamente se quem o possui se aceita como dependente e necessitado de ajuda. Se assim não for, os aplicadores da Lei Divina simplesmente conduzirão, à força se preciso for, aqueles que a descumprem.

Todo o exposto anteriormente serve de ato introdutório ao que agora se inicia. Caso alguém ache o contrário, faça-nos o enorme favor de provar, de contra-argumentar.

O ser humano é um ser social por natureza e por sociedade – ou comunidade – entende-se (ou pelo menos deveria ser assim) uma vida em comunhão, onde deve imperar o respeito e a colaboração mútuos em um verdadeiro trabalho em equipe.

Devido às suas imensuráveis diferenças, os homens reúnem-se em grupos sociais ou comunidades. Esses grupos e comunidade, apesar das diferenças individuais de seus membros, só se tornam únicos porque buscam objetivos em comum, deixando o pessoal, o individual em segundo plano. Pensando desta maneira, escolas, empresas, times esportivos, famílias, igrejas, centros, terreiros, constituem-se em comunidades.

Toda comunidade, para manter-se viva, precisa estar em constante renovação e evolução e uma das formas de isso acontecer é a entrada e a saída de membros. Fato este que costuma gerar conflitos, desequilíbrios dentro de qualquer grupo. Isso porque ao receber um novo participante, o grupo é obrigado a entrar em contato com novas ideias, novos comportamentos, novas diferenças.

A partir de então se inicia um embate, por vezes velado, entre o velho e o novo. Um não quer perder seu espaço, pois afinal há tanto tempo é membro daquele grupo. O outro quer conquistar o seu espaço dentro daquele novo grupo e, muitas vezes por medo, não manifesta seus pontos de vista. Se assim o faz, é massacrado, acusado de covardia, de fraqueza. Outras vezes o novo chega com tudo, causa furor, pois teve a ousadia de penetrar um ambiente que não lhe era comum.

Existem também os que se apegam a cargos e funções dentro de uma instituição, dentro de uma comunidade, como a uma tábua de salvação em mar bravio. Outra parcela há que tem tal apego aos bem materiais da instituição ou da comunidade, que fazem deles suas propriedades particulares. Erram todos, pois somos nada. A carne apodrece e desaparece, o ferro sucumbe à ferrugem, a madeira ao tempo e aos cupins e o papel se esvaece com a água. Enfim, tudo o que é matéria é finito e recuperável.

Não se fala aqui em perfeição. Isto é uma busca meramente utópica do ser humano. Temos todos os nossos defeitos, cometemos todos os nossos erros e ainda bem que é assim. Do contrário não teríamos o que aprender, consequentemente não teríamos o que evoluir. Enquanto matéria que habita este mundo físico jamais alcançaremos a perfeição, mas sim daremos mais um passo para atingi-la e isso se repetirá tantas vezes forem necessárias.O que se busca passar aqui é a necessidade de se ter respeito e amor ao próximo que, embora tão propagados, são tão esquecidos, assim como o discurso demagogo de políticos hipócritas.

Não é o tempo a que pertencemos a um grupo que nos torna melhores ou mais importantes que os outros. Existem aqueles que passam anos, décadas dentro de uma comunidade, grupo ou empresa, mas estagnam. Não é nossa condição socioeconômica que nos torna melhores ou mais importantes que os outros. Fácil perceber isso ao perceber que na sociedade como um todo, quem mais se ajuda são os mais necessitados. Fora isso o que existem são raras exceções à regra. Não é a cor de nossa pele nem a nossa aparência que nos tornam melhores ou mais importantes que os outros. Isso é apenas escolha do destino.

Para falar bem a verdade, não somos melhores, muito menos mais importantes do que ninguém. Quando partirmos e formos recebidos no outro plano, o espiritual, não será o tempo de vida, não será o dinheiro acumulado, não será a nossa pele, não será a nossa aparência que atuarão em nossa defesa frente às Leis da Criação. O que contará serão os nossos atos, as nossas atitudes no plano físico. Pena que muita gente se esquece disso. Por outro lado, graças a Deus que há pessoas que não deixam os ideais de caridade e humildade padecerem.

Sejamos, portanto, humildes sem esquecer que humildade não é subserviência escrava. Sejamos, portanto, caridosos sem esquecer que caridade é assistir a quem precisa, mas sem causar humilhação a quem já se encontra fragilizado.

Não adianta nada ir à igreja, ao templo, ao centro ou ao terreiro e nesses lugares ouvir as palavras do padre ou do pastor, do chefe ou pai (ou mãe) de santo e aplaudi-las. Não adianta nesses lugares fazer discursos em que se fala da necessidade de cooperação, de união, de caridade, de humildade, de respeito se ao sair – ou muitas vezes dentro do próprio local – a prática for exatamente a oposta. Não! Isso é hipocrisia.

Não adianta apoiar a ideia de fazer cada um a sua parte se a preocupação maior é a parte do outro. Em uma equipe, em um grupo, em uma comunidade, é necessário saber a parte do outro também e executá-la quando for preciso. A crítica, pura e simples, sem qualquer fundamentação é inútil para quem tem objetivos comuns, mas é capaz de destruir as relações em qualquer que seja o agrupamento social em que ocorram.

Vigiemos sim. Porém, vigiemos a nós mesmos em primeiro lugar, pois tetos de vidro se quebram com enorme facilidade e máscaras inevitavelmente caem.

Cícero Carlos Lopes – 23-02-2013

Cícero Carlos Lopes
Enviado por Cícero Carlos Lopes em 23/02/2013
Reeditado em 10/06/2016
Código do texto: T4156283
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