O DEUS DOS MALMEQUERES
Muito frio, ou talvez apenas essa sensação vincada pela humidade que nos envolve de chuva pouco intensa mas contínua.
A esperança de Março não se abriu ainda em Primavera, nem no ar, nem nas almas, mas há sinais como pirilampos coalhando a noite. E assim no prado verde da alameda alguém forasteiro de outras latitudes veria flocos brancos de neve que o não é.
Abriram-se pétalas brancas de malmequeres daninhos derramados como neve, mas que são na verdade erupções floridas não oriundas do céu como é a neve, mas da terra-mãe onde se alberga a vida, onde ela hiberna, enquanto o sol não perde a timidez de Inverno.
O eterno espanto da minha humana condição inunda-me de deleite e doce esperança, ante a revelação deste Deus escondido no ventre da terra e nos confins dos céus, que decerto sorri benévolo ante o meu comovido sentimento infantil de inocente mortal perante o que é divino e belo.
Este delíquio passa breve meus irmãos, até porque o trânsito me empurra não me deixando cair na tentação de quedar-me na estrada feito anjo papalvo embevecido.
Adiante então, que o sinal está verde, e antes que o taxista, meu insensível vizinho à retaguarda, fique vermelho de raiva, arranco desta minha breve ausência do real, não sem antes soltar um íntimo grito:
- Alá akbar! Ou Deus é grande! Tanto faz.