E se fosse verdade?

Se hoje, ao invés do dia da mentira, fosse o dia da verdade, qual verdade nós escolheríamos revelar? No país das maravilhas, todos os outros dias seriam dedicados à mentira. Assim, num faz de conta, inverteríamos o calendário. Somos tão apegados a algumas verdades, ouvidas aqui e ali, que se as virássemos do avesso veríamos que não são bem assim... Correndo o risco da forca, penso na impropriedade de verdades como a de Guevara, que traduzo livremente: Há que endurecer-se? Sim. Porém perder a ternura, jamais! Poética. Agora, alguém poderia ensinar como fuzilar pessoas, por pensarem diferente, e manter a ternura com as armas na mão? Outras, nem precisam de análise profunda, como a da vitrine onde estava escrito: "Sapatos são feitos de fórmulas. Tênis são feitos de ideias". Um texto que não diz absolutamente nada, porém convence que o moderno é calçar tênis de mil reais. Muitos de nós, filhos da geração Paz e Amor, recebemos de herança a capacidade de rebelião. Há verdades inconvenientes, contudo, que também surgiram como símbolo de rebeldia. Basta assistir a filmes antigos para vermos o incentivo glamoroso ao uso do cigarro. As embalagens atuais, com imagens fortes, não são páreo para impedir o fumo. A quantidade de químicos, que aliviam o mal-estar causado pelos disparos de ansiedade do cotidiano, supera a imagem terrível na caixinha. Somos frágeis em tolerância à frustração. Convivo com fumantes o ano todo e finjo que não me importo com o seu "raro prazer". Minha verdade de hoje? - Dá licença?! Prezo as coisas simples da vida, como o ar que respiro.