Creio na bondade inerente aos seres humanos, creio! Mas por que tantas guerras? Vivemos tempos caóticos, onde a todo instante somos bombardeados pela violência, nas ruas. A maioria de nós acaba imóvel, anestesiado e continuamente angustiado, inclusive pela violência que nos entra pelos meios de comunicação. O mal existe, assim como o bem, e o mal não é o traço mais forte da nossa humanidade.

Os gestos que testemunhamos no cotidiano — de amizade, solidariedade — raramente são divulgados e, quando são, em sequência vem aquela notícia triste que anula a anterior. Já percebeu? Eu testemunho nossas humanidades acima do mal! Vejo isso no dia a dia, vejo vizinhos se organizando para ajudar quem precisa, e constato que o voluntariado é uma realidade forte e presente no mundo, mesmo que as pesquisas tentem nos mostrar que o mal é maior, não creio!

No que querem nos fazer crer? No que acreditamos, e acreditamos por quê? A quem pertencem nossas mentes? À midia, à igreja, a quem? Porque espalhar medo e descrença? A quem interessa esta tamanha ansiedade, esse sentimento de impotência?

Existe a liberdade, afinal? E a ciência que ainda hoje, em seus ramos mais ortodoxos, resiste ao que não consegue medir e explicar? É pelo conhecimento que nos libertamos mas, em alguns casos, talvez muitos, ainda nos vemos limitados demais em nossos pensamentos, anseios e necessidades, sem perceber a integração de cada um com todas as pessoas e coisas ao nosso redor.

Mas o tema que me moveu a escrever foi o Mistério. Não a palavra carregada do seu significado ligado a dogmas ou doutrinas religiosas, mas sim na amplidão de seus símbolos: o enigma, e tudo aquilo que a nossa inteligência é incapaz de compreender.

Aceito o mistério: se não me assusta, minto. Assim como a maioria de nós, humanos. Não compreendo o misterioso, entro em sintonia com ele, quando imóvel, e em silêncio o sinto.

O mistério nos foge ao controle. E o que nos foge ao controle, ou é difícil de explicar, nos assusta. O mundo é muito maior que o visível, é além. É como um iceberg, do qual se vê apenas a ponta: o que está oculto é muito mais significativo.

Diante do estranho, do inusitado me abro, mesmo assustada deixo que entre, sinto. Busco a cada dia renovar-me para recebê-lo: num pássaro que canta pousado na janela, num Saíra que luta com sua imagem no retrovisor do carro.

Se penso, deixo de sentir, perco o momento. Se me entrego, escuto seu canto com meu coração. E é pelo silêncio que o mistério me penetra a alma. Se deixo de nomear o pássaro ou a flor que vejo, torno-me a flor, sou o pássaro, surpresa: eles me transformam, me inundam com sua beleza. Só por ser flor ou pássaro, ou a onda do mar, meu dia se transforma no mais belo da minha existência.

Talvez seja esse o Grande Mistério: o amor da Natureza por si mesma, que possa nos ensinar, se nos abrirmos à auto-estima! Sei que a capacidade de sentir é o traço mais forte da humanidade, e é na sua expressão que devemos investir — pintura, cinema, escultura, teatro, música, dança, poesia, cultura. Ou, simplesmente, cuidar dos jardins, semear flores. É na demonstração e comprovação permanentes desta nossa essência que precisamos acreditar como terra firme para a humanização das sociedades.

Vila Velha(16/01/07)

 
Zeni Bannitz
Enviado por Zeni Bannitz em 22/03/2007
Reeditado em 02/11/2012
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