A borboleta, as orquídeas e a estrelinha

Na calçada estava a pequena monarca. Pendia um pouco para o lado esquerdo. Sem dar sinal de vida, foi suspensa por uma asa. Com isto se evitaria que fosse pisoteada, além de um possível final feliz em cima do muro de pedra. O final feliz, poderia não ser bem para a nossa personagem, pois muros costumam ser escalados por gatos ou servir de pouso para pássaros famintos. O toque dos dedos polegar e indicador na asa fininha causou o bater fremente da asa livre. Na natureza não há movimento mais delicado que o bater de asas de uma borboleta. Nem tudo estava perdido. Seguindo sua peregrinação em busca de papéis para levar na toca do leão, a andarilha entrou no Mercado Público para tomar um tradicional suco de salada de frutas. Qual a surpresa? Uma exposição de orquídeas! Ficou frente a frente com flores alvas, amarelas, pink. Havia um pé com três delas em tom lilás como um abajur. Ela sorriu em meio às flores como se fosse uma delas. Sentiu em sua alma que em outros tempos viveu como uma singela labiata, protegida no alto de um caule na floresta. Bons tempos, quando havia florestas e os leões não se alimentavam de papéis. Alguém piedoso dirá: coitada, além de salvar borboletas que não queriam ser salvas, ainda sorri com a certeza de ser uma florzinha... Assim, se passou manhã e tarde daquele dia. À noite, chegou a hora das preces. Nuvens mais próximas corriam livres no céu. Acima delas, um chapéu cinza-chumbo, numa formação gigante de nuvens. Pediu pela saúde de pessoas amigas. Rendeu graças pelo dia cansativo, mas proveitoso que passara. Prestes a baixar a persiana da janela do quarto, nuvens se abriram num instante e uma estrelinha brincalhona piscou lá de cima desejando a todos uma boa noite. Assim seja!