MORRER INTERINAMENTE

MORRER INTERINAMENTE

Maria Teoro Ângelo

Com a frase: “Dormir é morrer interinamente” Brás Cubas, personagem do livro de Machado de Assis, “ Memórias Póstumas de Brás Cubas”, confortou-se depois de querer morrer de amor. O jovem Brás estava sofrendo uma desilusão amorosa, pois fora usado, traído, explorado e enganado. Não havia dinheiro que chegasse para a interesseira moça ,aproveitadora das boas intenções do jovem. O pai de Brás resolve mandá-lo para a Europa.

No navio pensou em morrer, em se atirar ao mar. Via na morte a solução para seu mal de amor. O capitão do navio também levava a mulher em fase terminal, acometida de doença seriíssima à procura de socorro nas terras do além-mar. Vendo o sofrimento do rapaz, ela ainda encontrou forças para consolá-lo.

No meio da noite há uma terrível tempestade e a morte se torna próxima , igualando-os diante da possível catástrofe. Diante do perigo, todos se apegaram à vida, no sentido natural da sobrevivência. Brás Cubas, que havia desejado tanto morrer, lutou desesperadamente pela vida. A tormenta não fez vítimas e ele resolveu dormir dizendo que dormir é morrer interinamente. Naquela mesma noite a mulher do capitão morreu

Machado de Assis colocou literalmente no mesmo barco personagens em confronto com a morte. A mulher, que a tinha como certa, embora devesse guardar uma esperança de salvação, não foi egoísta e tentou consolar o próximo. O capitão fatalmente perderia a sua amada e sofria, mas levava o barco ao seu destino. Brás Cubas, achando que morrer seria a solução, não morre e tendo experimentado a possibilidade de morrer, apega-se à vida.

Pena que dormir não é o que Brás pensava. Dormir não é morrer, mesmo que seja só por um período temporário. Dormir é viver e viver da forma mais intensa, pois é dormindo que sonhamos e sonhando é que expressamos os nossos medos e desejos. No sonho e com o nosso superego rebaixado somos nós mesmos. No sonho há sempre uma recorrência dos nossos traumas e para muita gente dormir é a hora do pesadelo. Penso que haja algum tratamento para abrandar tudo isso, mas ninguém está livre de sonhar com as melhores formas de felicidade ou de se debater e gritar com os monstros em forma de alegorias que nos assombram enquanto dormimos.

Nesse ponto do livro, Brás Cubas continuava tão ingênuo quanto fora deixando –se enganar por uma aventureira. Ninguém morre interinamente. A morte é definitiva.

Lillyangel
Enviado por Lillyangel em 28/03/2007
Reeditado em 24/05/2010
Código do texto: T429454
Classificação de conteúdo: seguro