A Bruxinha.

Uma História para Daniela.

A Bruxinha.

Casei-me muito jovem. Tive um filho aos 16 anos e outro aos 18. Por isso, quando fiquei grávida, 15 anos depois, aos 33 anos, foi uma surpresa geral.

Como eu já tinha dois filhos homens, a torcida era por uma menina. Enfim, minha filha Daniela chegou, trazendo a alegria para toda a nossa família.

Daniela era alegre, inteligente, falou e andou aos 10 meses, bem antes dos seus coleguinhas filhos das minhas vizinhas. Era também independente, vaidosa, gostava de escolher as roupinhas que vestir, fazia a alegria dos fotógrafos, que ficavam encantados ao vê-la fazendo poses para as fotos. Mas era também teimosa quando queria algo.

Tenho muitas recordações engraçadas da sua infância, mas, uma em particular, emociona-me até hoje.

Rose (filha de uma vizinha) e Daniela tinham a mesma idade. As duas cresceram juntas e foram sempre muito boas amigas. Quando as meninas estavam com 3 anos, a Rose ganhou uma boneca de pano, linda, com vestidinho bordado, chapéu com fitas, uma graça de boneca. Na minha infância, toda boneca feita de pano chamávamos de “bruxinha”. Bem, a bruxinha da Rose, comprada em uma feira de artesanato, era linda, muito bem feita, com seus olhinhos de botão, brilhantes. Quando a Daniela pegou a bruxinha no colo, não queria devolver à coleguinha. Ela chorava desesperada, querendo a boneca e por mais que eu fizesse, não conseguia acalmá-la. Só consegui que ela ficasse calma quando prometi que faria uma bruxinha para ela.

Eu nunca fui boa costureira. Tinha uma velha máquina de costura, para fazer consertos nas roupas, mas... fazer uma boneca?

Para acalmar a minha filha, aceitei aquele desafio. Com retalhos de pano e estopa, fiz uma bruxinha com cabeça, corpo, braços, mãos, pernas e pés. Com tiras de retalhos coloridos, confeccionei trancinhas que costurei na cabeça, formando cabelinhos parecidos com os da boneca “Emília”, do Sítio do Pica-Pau Amarelo. Até aí, tudo bem. Estava um horror, mas, era o que eu podia fazer. Mas e o rosto? Como fazer olhos, nariz e boca? Recorri a Agazi, uma vizinha que fazia desenhos e pintura em tecido e pedi “pelo amor de Deus” que ela me ajudasse. Ela alegou que só sabia pintar flores, frutas, coisas assim, mas que daria um jeito. E com a maior boa vontade, pintou uns olhos enormes, nariz e a boca com um meio sorriso. Ficou muito feia! Eu e a minha vizinha ríamos muito! Eu estava certa de que a Daniela ia jogar aquela bruxinha longe e que o berreiro ia recomeçar.

Minha vizinha acompanhou-me até a minha casa: não queria perder a cena que adivinhávamos, iria se desenrolar.

Contendo o riso, entreguei a bruxinha para minha filha. Ela, muito séria, levou a boneca até a altura dos olhos, olhou-a fixamente e de repente, uma centelha de amor brotou de seus brilhantes olhinhos. Deu um forte abraço na bruxinha. Apertou-a nos braços, como se fosse a boneca mais linda do mundo. Foi emocionante! E daquele dia em diante, a bruxinha foi a sua companheira inseparável.

Esta história não termina aqui.

Quando aos 25 anos, às vésperas do seu casamento, minha filha estava separando os brinquedos que ia doar para crianças carentes, ela guardou a bruxinha que eu fiz, dizendo que aquela bruxinha ela iria levar para a sua nova casa. Chamei a boneca de “bruxa feiosa”, só para implicar com ela, mas ela nem ligou.

Hoje, aos 33 anos, grávida do primeiro filho, para fazer o quarto do baby, ela novamente estava separando os enfeites e brinquedos para doação, quando vi que ela guardava a bruxinha que já está bem gasta pelo passar dos anos.

Uma amiga perguntou-lhe por que ela havia separado aquela boneca tão velha e ela respondeu:

-Essa boneca não tem preço. Foi minha mãe quem fez.

Confesso que chorei de orgulho e emoção.

Obrigada, Dani, por você existir.

Nilda Dias Tavares.