Privê Vermont, uma floresta privada?

Como pode uma floresta ser privada? Ter um dono? Não imagino que todos aqueles saguins, aqueles sanhaçus e bem-te-vis, e todos os pés de eucaliptos são propriedades de Fulano de Tal. Ou ainda, que sob a decisão judicial, vários formigueiros, cupinzeiros, e serpentes pertençam ao vencedor do litígio. Aos herdeiros de Doutor Beltrano de Albuquerque de Medeiros. Em Camaragibe, sim! Aqui tudo pode, desde que ninguém se incomode. Tem dono ou donos, não sei quem ao certo. Lembro que certa vez, um espertinho de plantão, destes que acordam todo dia querendo encontrar algum besta por aí, e quando se encontram, há um grande negócio, para ele claro, estava loteando tudo, vendendo cada palmo daquele chão. Alguns pés de árvores foram retirados, desmatados, destruídos, mas a turma do deixa disso, mandou acabar com a festa. E sei que entraram em uma questão judicial que talvez se arraste até hoje.

Dizem que o lugar teria sido utilizado pelos os Holandeses que se dirigiam a Camaragibe, e que há até algumas inscrições rupestres lá dentro.

Uma mata. Não vou dizer que o seu muro frontal seja eficiente, que as pessoas não a frequentem, até vão, mas, de forma clandestina, pelos lados, como se tivessem invadindo. Acontecem muitas caminhadas, passeios e aventuras. Mas, também coisas ilícitas habitam a área. Uso de drogas, extermínios e talvez desovas e enterros clandestinos.

Quem vê de longe, de alguns ângulos privilegiados, vê a escrotice humana que vai aos poucos invadindo a floresta. Gente mesquinha e miúda devorando paulatinamente árvores e arbustos para saciar sua ganância financeira, de posse e patrimônio e aos poucos vai demarcando o território, como um cão faz. Só que este com xixi, ecologicamente bem mais correto.

Este paço deveria ser municipalizado ou ainda, ser estadualizado, pois é um espaço de interesse público. Alguém duvida? Há legislação pra isso.

De acordo com a lei, a desapropriação pode ser realizada em duas situações distintas: por necessidade ou utilidade pública ou interesse social. A desapropriação está amparada pela Constituição Federal de 88, em seu artigo 5º, inciso XXIV – “a lei estabelecerá para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvada os casos previstos nesta Constituição”.

O fundamento político da desapropriação é a supremacia do interesse coletivo sobre o individual, quando incompatíveis. E neste caso há de sobra!

Mas pra isso não podemos ficar calados, temos que fazer alguma coisa. Não podemos deixar como está pra ver como fica.

Lembro que lá dentro da mata, há um belo e reluzente açude, fechado pros olhos da maioria. Só tem acesso quem tem coragem, ou é articulado em uma oportunidade grupal autorizada.

Vários políticos nas últimas eleições tiveram como proposta tornar este espaço um Parque Ecológico ou um Jardim Botânico. É sensato. Mas, terminado o pleito, não escutamos mais ninguém falar todos ficam mudos, e talvez surdos. Deve ser conveniente…

Talvez um dia eu tenha entrado pelo portão. Mas, quase sempre entrei pelos flancos. Lá dentro tem uma estrada que chega até este açude, árvores que caem formam pontes rústicas adornadas por líquens de um verde e branco enigmático. Enormes pés de eucaliptos que se comunicam com a gente sibilando sonoros gestos.

Em uma pergunta lançada no universo facebookiano sobre a questão, obtive algumas respostas triviais e instigantes. Pela pressa, a foto saiu até com um erro de português, notado apenas pelos mais atentos. A pergunta era. “O que falta para a mata do Privê virar Parque Municipal em Camaragibe?”. As respostas deste post bastante comentado e compartilhado foram as mais diversas, entre elas: Vontade política e ação ou movimento da população; força de vontade de alguns políticos, iniciativa, interesse e amor à cidade tanto da gestão pública como o cuidado da própria comunidade; algum incentivo em dinheiro para os políticos corruptos fazerem isso virar realidade, se não traz benefícios pra eles, pra quê mudar? Deixa como tá! A resposta mais irônica que achei foi “falta governante, coisa que nunca teve”. Para cuidar desta questão, realmente, nenhum fez o seu papel. Mas, lembrem-se, todo poder emana do povo.

Seria uma riqueza imensurável para todos os moradores de Camaragibe, caminhar respirando o ar puro e a beleza natural da nossa amada cidade.

Não é justo que uma área que deveria ser preservada ostensivamente, com todo o estudo acadêmico de suas espécies vegetais e animais, e que estas fossem divulgadas para os estudantes e toda população de forma dinâmica e criativa visando a garantia de sua continuidade e preservação inegociáveis. O que vemos é que ao longo do tempo esta área foi de certa forma abandonada. Ainda que timidamente utilizada para algumas caminhadas vespertinas informais. E o pior, aos poucos, vão invadindo suas áreas em decorrência da falta de qualquer tipo de fiscalização oficial e vão degradando e espoliando, até que não sobre mais nada. Se deixarmos.

O Privê Vermont talvez seja celebração de nossa mediocridade, de nossa despolitização e cretinice. Onde você estava e o que você fez quando derrubaram a última árvore?

Por Magal Melo