"A Superficie das Coisas..."

“A superfície das coisas...”

Noites frias... Andando se descobre os melhores lugares para degustar um bom caldo, se possível em agradável companhia. Foi numa destas noites em que o corpo pede calor que fui de encontro aos sabores de um bom caldo de canjiquinha com costelinha, servido em panela de barro com requintes de “casa grande”. Aqui pelas paragens de Minas, há lugares aconchegantes repletos de lembranças de um passado onde o fogão de lenha era destaque dentro das velhas cozinhas, onde as sinhazinhas agradavam seus pretendentes com fartas quitandas...

Sentada em um banco, por detrás da mesa antiga, aguardava meu pedido quando meus ouvidos, perseguidos pelos altos comentários, levaram-me a uma atenção descompromissada sobre dois senhores que conversavam apaixonadamente...

O que aparentava mais idade, rosto avermelhado, cabelos grisalhos marcava com o dedo algumas batidas sobre a mesa e gritava: “somos todos guiados, não vês”? O outro moderadamente tentava argumentar alguma coisa que pudesse fazer sentido com o que acabara de escutar. O primeiro afirmava que assuntos sociais e políticos não aparecem no vácuo e sim numa atmosfera socialmente condicionada. Como tal, não somos livres em nossas escolhas, somos influenciados todo tempo por elementos inconscientes, que ficam ocultos do observador, como se estes (pensamentos condicionantes) formassem o próprio lugar que habitamos- um habitat social... Ouvidos para quem quer ouvir... Agucei os meus! Gregório era o nome daquele que mais gritava- mandava sincopadamente sua lógica. Para ele, há sempre um que domina e este (pensador maior) determina todo um sistema de opiniões e teorias que lhe parecem inegavelmente verdadeiros – assim se formam as ideologias...

Observando que o amigo nada dizia, argumentou:

Sem duvida, amigo, esta é uma atitude racionalista, incompleta e ate um pouco vaga - admitiu Gregório. Sem mais disposição para levar á diante aquela conversa, o amigo, firmou o olhar na jovem que passava do outro lado da calçada, desejando ser novamente adolescente. Arranhar as superfícies das coisas, sem aprofundar em detalhes racionalista ou irracionalista. Saber e afirmar a animalidade do homem... E com um prazer inenarrável, imaginava se esconder detrás daquela arvore - verde e grande que estava no canto da praça- e pelos motivos só dele, apelar para suas emoções e paixões e convidar a um passeio, a doce menina-mulher que acabara de passar, desfilando o paraíso frente á seus olhos e lhe aguçando os sentidos...

Venusiapimentel/013