NELSON CAVAQUINHO

Poeta dos cabelos cor de prata é a mais lírica e perfeita tradução para o menestrel do morro que o samba batizou como Nelson Cavaquinho. Diga-se, a bem da verdade e de um passado de glória, que a MPB tem suas raízes mais profundas e seus melhores frutos na Mangueira, estação primeira, cenáculo da velha guarda. Desta “sociedade dos poetas mortos” a Verde-e-Rosa herdou uma antologia de que se orgulha a música popular brasileira, tendo-a como referência as novas gerações de compositores e intérpretes. Ao lirismo de Cartola juntam-se as crônicas da vida e suas paixões, poética e musicalmente retratadas nas composições de Nelson. Crônicas narrativas de paixões, amores, sonhos, traições como o "Ninho Desfeito", tudo a motivar desenvolvimento de temas do cotidiano cujas letras, despretensiosamente, revelam a natural poesia nascida da pura inspiração. Em se tratando de Nelson Cavaquinho, quase sempre o letrista e o compositor estão numa só pessoa agraciada pelos dons da poesia e melodia.

Todos os questionamentos e inquietações humanas vêm à cena no palco da vida nem sempre iluminado pelo sol ou à luz da lua, mas ocorrem na penumbra da dor e da solidão de uma “Luz Negra”. O homem apaixonado, desiludido e só, é confessional no que só a música exterioriza: “Sempre só, eu vivo procurando alguém que sofre como eu tamb
ém e não consigo achar ninguém [...] A luz negra de um destino cruel ilumina um teatro sem cor onde estou desempenhando um papel de palhaço do amor”. Estes versos se tornaram expressão máxima de uma poética aparentemente simplória, enquanto carregada de forte conteúdo psicológico. Poetas consagrados em nossa literatura gostariam de tê-los escrito. Mas a trajetória de um poeta de rua e  de bar, poeta do morro, é tão incerta quanto o seu destino. E Nelson surpreendeu encantando entre o riso e o pranto, entre A flor e o espinho: “Tire o seu sorriso do caminho, que eu quero passar com a minha dor”. Estes versos deixaram e deixam poetas e compositores de boca aberta. Não há academia que ensine inspiração. O poeta subiu e desceu o morro, andou por ruas e becos a refletir: “Quando eu piso em folhas secas, caídas de uma mangueira, penso na minha escola e nos poetas da minha Estação primeira”. Foi protagonista de histórias narradas nas estrofes e nos acordes dos conjuntos regionais, dando Notícia: “Já sei a notícia que vens me trazer, os seus olhos só faltam dizer, o melhor é eu me convencer”. Um caso real, de que trata a letra.

Essas crônicas do cotidiano estão nas letras de Nelson Cavaquinho, como “Rugas” do tempo que não lhe fez perder a fé no Divino com os pés a pisarem o chão da poesia na expectativa do Juízo Final: “O sol há brilhar mais uma vez. A luz há de chegar aos corações. Do mal será queimada a semente. O amor será eterno novamente”. Em meio a esse lirismo-amoroso, misto de paixões e decepções a “comédia humana” suaviza o trágico em Cuidado com a outra: “Vou abrir a porta. Mais uma vez pode entrar; é dia das mães, eu resolvi lhe perdoar”.

Nelson anteviu e precaveu-se do que lhe dariam ao seu fim em Quando eu me chamar saudade: “Sei que amanhã quando eu morrer, os meus amigos vão dizer que eu tinha um bom coração. [...] Depois que eu me chamar saudade, não preciso de vaidade, quero preces e nada mais”.

Mas os Degraus da Vida mantêm o poeta imortalizado na obra que deixou. E é por ela que ainda brilha e brilhará sempre em todos os palcos onde a verdadeira música popular brasileira estiver à luz da sua inspiração eternizada em poesia e melodia.
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Ouça
Luz Negra * Intérprete CAZUZA
http://www.youtube.com/watch?v=3l3D3eOEOaQ

A flor e o espinho* Intérptete ROBERTA SÁ
http://www.youtube.com/watch?v=NDCLa453ajk

JUÍZO FINAL*  Intérprete CLARA UNES
http://www.youtube.com/watch?v=WiH6oAYtMNI

Cuidado com a outra* Intérprete CHICO BUARQUE

http://www.youtube.com/watch?v=Y0V6ugFPtLI
 
LordHermilioWerther
Enviado por LordHermilioWerther em 13/06/2013
Reeditado em 13/06/2013
Código do texto: T4340317
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