PAGANDO MICO

O texto a seguir foi extraído de “Crônicas da Vida Inteira”, livro inédito sobre fatos da minha vida, adaptado para o Recanto das Letras.

PAGANDO MICO

Já fazia decerto um mês ou mais que eu estava no seminário. Certo dia, sem ter o que fazer, eu estava matando tempo lá pela frente do prédio. Nisso chegou um senhor, parou o carro, pôs o pescoço pra fora, olhou-me e perguntou se o Padre João Batista estava.

— Padre João...? Aqui não tem nenhum Padre João Batista, não senhor — respondi na maior convicção.

O cara olhou-me num sorriso, fez “hum”, coçou o nariz e perguntou:

— E o novo reitor como é que se chama?

— Hum? Como é que se... — perguntei sem entender.

“Que pergunta mais idiota!”, pensei cá com meus botões. “Onde já se viu?... É Reitor e pronto”.

Nisso, pra minha vergonha, o Padre Reitor apareceu à porta e, vendo o amigo, foi logo chamando-o. O sujeito olhou-me com novo “hum”, fechou o carro e, quando passou por mim, deu uma paradinha e falou em tom de deboche:

— Está na hora de ser mais esperto, ouviu, rapaz!

Fiquei com uma vergonha e uma raiva sem tamanho. Está certo que eu tinha vindo lá do sertão, que era um matuto criado na roça, mas não me considerava nenhum estúpido a ponto de merecer tal afronta. Como, até então não conhecia ninguém chamado assim, eu pensava que Reitor fosse o nome do padre, ora! E por que não podia ser? Assim como há Nestor, Heitor... Por que não Reitor, ora bolas!?