Dias lindos

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Hoje não está um dia lindo. Mas ela saiu a passear. Não para espantar a feiura do dia, muito pelo contrário. Em dias feios, tristes e magros, sei que gosta de se arrumar para sair. E eu, como muito ofegante às vistas de minha janela, e de sua espera, conheço muito bem quando será o dia dela se embelezar para sair.

Quando todos estarão em casa, guardados, bem cuidados. Fugindo de todos os perigos da respiração.

Também sei quando ela precisa respirar. E quando precisa ficar somente admirando o mundo.

Admirar e respirar o mundo não são coisas que se faça em dias lindos. Disso está cheio o espaço.

Em dias que não são lindos, é assim é que a vejo. Vivendo.

E ela não sabe de minha existência.

Mas eu bem sei a dela.

Gosto de seu vestido. É sempre o mesmo. Tom sóbrio, mas decotado nas costas e a saia levemente esvoaçante. Quando o vento lhe ressoa, há algo a mais para ser mostrado. E ela, ainda que sabendo não haver ninguém olhando, cuida para que nada saia do seu lugar.

E seu sorriso delicado é o que mais encanta. Não, delicado não. Satisfeito, eu diria. Mesmo assim, discreto (não o suficiente para passar despercebido se alguém na rua houvesse).

E ela segue até o outro lado, atravessa a calçada. Fica parada, admirando o lado de cá. Por horas, longas horas... Depois, olha para o relógio, observa o céu por mais um tempo. Em seguida, olha novamente para o lado de cá e segue o seu caminho.

Nunca sei a que horas voltará. Mesmo assim, fico ali, esperando sua volta. Jamais consegui captar esse momento.

Até que outro dia se vai, e outro, e mais outro... E quando, de repente, outro dia não está lindo, meu coração palpita.

Não preciso correr à janela. Sempre estarei ali. Não sei se à espera de mim, ou dela, que nunca soube de minha existência.

Ou talvez ela saiba.

(Adriana Luz – 02 de julho de 2013)

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