Anarquia
Você abriu a gaveta de mim: como mulher relapsa e desordeira, tirou de lá os sentimentos, carinhos, alegria e vontade de viver e deixou espalhado sobre os móveis, sobre a cama, na escrivaninha , em todos os lugares.
Eu, por minha vez, tão pouco afeito à ordem, acatei seu projeto anárquico sem murmurar. Se há caos no sentimento, assim seja; se há desordem na prática do bem querer, não serei eu que juntarei o que está disperso e devolverei tudo nas gavetas de antes, colocando uma ordem asfixiante em tudo.
Apenas sei, isso posso dizer, que na provisória existência do sentir, na precária vida do querer, proclamo a vitória da anárquica ação do arrebatamento! Viva e vivamos!
Poderá chegar o dia (quem sabe?) onde faça falta dos sentimentos espalhados, da sensualidade temperada em doses excessivas e da bem queirança sem limites. Nesse momento, apenas abundará um ente terrível e indesejado chamado saudade.