Uma coisa é o que se escreve outra quem escreve...



Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.
Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.(...)
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo: "Fui eu ?"
Deus sabe, porque o escreveu.

                                   Fernando Pessoa

 
     A matéria prima do que escrevo é ponto de vista do cotidiano. O MEU ponto de vista e nem sempre do MEU cotidiano!  Alguns parecem concordar outros não e isso é muito bom porque assim tenho a rara oportunidade de conhecer um pouco do que pensa e sente quem me lê e fico feliz em constatar que, através do que escrevo, tenho mais construído afetos do que o contrário.
     Por vezes um gesto, uma atitude de alguém, algo que vejo, leio, me contam ou sinto, chama a minha atenção ao ponto de querer elaborar uma reflexão, uma opinião, um elogio, uma declaração e pode ser nas mais diversas formas que a escrita permite. Nada, mas nada mesmo escapa da observação de quem escreve sobre cotidianos, vividos e ou imaginados, mas uma coisa é o que se escreve, outra é quem escreve...
     Tenho algumas convicções e essa é uma delas: o jeito que somos e entendemos a vida nos influenciam tanto no que escrevemos, quanto no que lemos, portanto, não me surpreendo com interpretações do que escrevo completamente opostas ao que quis dizer e não vejo problema nenhum nisso: o fato de pensar diferente não me torna melhor nem pior que ninguém!
     Entendo quando me associam ao que escrevo e o bom é que, não raro, também faço associações desse tipo e não estou sozinha em agir assim. Dia desses um amigo me disse, em tom de desabafo: “Se escrevo algo triste me animam, são solidários, se escrevo algo alegre, se alegram também e me dão parabéns, se escrevo sobre amor me felicitam por estar apaixonado enfim, será que pensam que tudo que escrevo é a minha vida ?”
     De minha parte afirmo que é muito bom sentir esse lado humano e sensível aflorando diante do que escrevo mas não faria nenhum sentido sair por aí me justificando, explicando se escrevi sobre ou para alguém ou se literalmente “inventei” ou fantasiei o que escrevi, pois o importante é O QUE escrevi e não quem sou eu, nem por que escrevi aquele texto.
     Gosto de escrever na primeira pessoa e, vez ou outra confusões por isso. Lembro aqui de um texto que fiz sobre Separação e choveu e-mails e comentários de gente se solidarizando comigo, lamentando meu “infortúnio”...Neste caso senti-me “obrigada” em colocar no final do texto que não era nada pessoal, transformando um texto literário em página de notícia...
     Diante disso devo dizer que me dou o direito sim(Licença Poética?) de brincar com as palavras, atribuindo não apenas o significado real mas o sentido que mais me agradar! No que escrevo posso ser pacificadora ou conflituosa, ardida como pimenta, azeda como um limão ou doce feito mel, assim determine a linha de argumentação e o tema que escolher.
   Portanto, quando for lê um texto de quem quer que seja, não julgue, não faça interpretações do que apenas imagina: sinta o texto! Vibre na sonoridade das palavras, na dureza ou na leveza do que aparentam ser e nem sempre são. Uma coisa é o que se escreve outra quem  escreve e por isso é tudo tão maravilhoso!

     Obrigada sempre pela acolhida ao que escrevo. Sei que sou uma pessoa melhor porque e quando consigo me expressar assim.
 

*Brincando com grifos...