ACAMPAMENTO

–“Este crepúsculo sobre a floresta, quando o contemplo todas as tardes, impulsiono-me a pô-lo-em-obra-de-verdade, querida!” disse Jaspers Sodré segurando ternamente entre suas mãos as delicadas mãos de Luzia Elisabete, sua mais preferida amiga, como a considera.

–“De fato, pronunciou-se Elisabete, já me mostrastes a coleção dos diversos aforismos e poemas que grafastes nos cadernos, azul e amarelo, sempre que te colocastes sob esta luz vespertina, no alto deste monte”. Falava ao seu amigo, enquanto reclinava filialmente sua cabeça sobre o ombro dele, deixando-se invadir pela glorificação da luz no findar do dia.

Jaspers envolveu sua amiga num abraço e, após alguns minutos mergulhados no êxtase contemplativo do advento da noite com a lua e o céu estrelado, dialogaram suficientemente sobre a autenticidade de sua amizade pessoal, bem como sobre a primazia da responsabilidade no amor, a vinda da morte, a mística cristã, entre outros temas genuínos que passam ao longe da banalidade característica dos assuntos vulgares.

Ambos aquiesceram em acender a pequena fogueira, a fim de se aquecerem por mais tempo garantindo a maior duração de seu encontro na contemplação do céu estrelado. Dado que Jaspers fazia considerações a respeito da possibilidade da luz conferir para a linguagem humana a possibilidade de existência das coisas, pois para o pensador Martin Heidegger, lançar luz sobre uma coisa é nomeá-la. Aí, Elisabete se expressou:

–“Ah, meu caro! Mais do que tais especulações filosóficas esta tênue iluminação contemporânea ao calor dessa matéria que se consome neste fogo, esta Fogueira é para mim um fenômeno de luz e ternura, um evento místico que me refere ao inominável “Tu eterno”. Para nós tal fenômeno nos diz sobre o mistério do Amor, prenunciando sacramentalmente o encerramento do “eclipse de Deus”.

Novamente juntos, na proximidade da fogueira, sentados sobre o tapete, contemplaram o assomo do luar no negro manto estrelado e, sem mais palavras, no calor do abraço recíproco, sentiram seus corações a palpitarem perante o desvelar-se do Ser nos fenômenos que estavam portando o mistério.

Jaspers e Elisabete intuíram o eterno, abrasados no Amor, até que no devir temporal, o sono chegou e, erguendo-se caminharam até a tenda do acampamento. Ali encerraram os seus mundos, na iminência de uma nova presença.