CORAÇÃO DE ESTUDANTE

Mamãe gostava de lima. Pegava o fruto, cheirava, rolava nas mãos para ficar mais suculento. Com canivete tirava um cordão de casca inteira para secar ao sol. O mesmo acontecia com a casca da laranja que, junto com a flor da laranjeira, resultava em perfumada infusão. Depois de descascada, era partida para que eu ganhasse a tampinha. Diferente da laranja, da lima se saboreava os gomos, quase que alvéolo por alvéolo. Dentre as laranjas, havia uma espécie cuja parte branca, bastante grossa, servia para doce, mas o sumo era amargo. Para tudo que a natureza dava amargor, mamãe atribuía um efeito curativo. Com a ajuda do sol, as garrafadas resultavam de misturas exóticas, nunca reveladas para as vítimas. Criança que não limpasse o prato, logo se via ameaçada pela poção servida num copinho plástico, daqueles que vinham com os vidros de fortificantes. Daquele tempo, ficou o gosto pelos frutos, a certeza de sua importância para a saúde, bem como uma afinidade pelos tratamentos alternativos, embora não descarte de forma alguma o auxílio da medicina tradicional. Muita Coca-Cola depois, esta semana será objeto de votação um projeto de lei incentivando a alimentação saudável nas escolas. Algumas escolas já oferecem opções de lanches apropriados, além de aulas sobre alimentos e outras práticas louváveis - como o da separação do lixo - que são levadas depois pelas crianças para os pais. Alguns pais, de modo surpreendente, inicialmente se mostraram contrários à proibição das frituras e dos refrigerantes. De leis nós temos fartura, a exemplo do Decreto-Lei nº 986, de 1969, que se busca modificar com o projeto a ser votado. Mas o que se espera é que a iniciativa das escolas e até do poder público encontre simpatia nos lares. Assim, se todos nós fizermos o dever de casa, nossas crianças, como diz a canção de Milton Nascimento, saberão florir bons frutos.