Flores no deserto

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Naquele dia, a mãe amanheceu seca como as flores do deserto. Olhou-se no espelho não havia mais encanto no seu rosto. Os olhos eram opacos, não existiam mais sorrisos no seu rosto. Os filhos adolescentes perdidos em seus afazeres não a viam mais. Eram cruéis em suas exigências:- Mãe, quero isso, quero a quilo. Não a olhavam mais, era uma provedora, primeiro afetiva, agora econômica, atualmente, também uma mera transportadora de filhos. Sentia-se um poste, deu a luz e mais nada. Não sabia se era necessária aos filhos. Existia uma dor esmagadora que ia destruindo todas as lacunas da sua vida. Não conseguia olhar o que tinha de bom nos filhos. Sentia-se deteriorada pelas brigas constantes, as cobranças e as insatisfações deles.

Queria a liberdade de dormir a hora que sentisse vontade. Não fazer mais almoço, janta e esquecer os ranchos com os malditos supermercados cheios com filas imensas. Não sentia mais prazer naquela vida de regras que ela mesma criara. Não sentia saudades de quando os filhos eram pequenos, pois, nessa época, a prisão era domiciliar. Eles cresceram e a sensação de opressão foi crescendo junto, não lhe deram a aclamada alforria, continuou presa a horários, obrigações e muitas chateações. Observou o rosto mais uma vez no espelho, ainda era bela. Possuía traços fortes com olhos escuros, uma pele muita branca e um corpo torneado pela academia, uma das poucas coisas que podia fazer. Sim, podia viver. Abriu as portas do guarda-roupa, escolheu as melhores roupas e jogou numa mochila. A porta se abriu e o filho berrou: - mãe, quero janta. A mãe deu um sorriso irônico e disse: virem-se, pois não quero choro nem vela, estou deixando as panelas.

O filho olhou sem acreditar nas malas da mãe e disse:- Aonde tu vai esta hora da noite? A mãe respondeu:- vou embora, vou viver a minha vida, de hoje em diante ficaram com o pai de vocês.

.- Que vida? - Somos a tua vida, mãe! Gritava o filho chamando as irmãs. As irmãs não o ouviam, cada uma delas, enfiada no seu mini - mundo particular sem ligar para mais nada. A mãe sentia uma agonia, um sufocamento que não a deixava respirar, via lágrimas correndo no rosto lindo do filho. Ele sempre fora o seu amor maior. Mas,também era uma fonte inesgotável de incomodação. Saiu, lentamente, ouvindo os berros do filho. Sentia o vento da liberdade batendo levemente no rosto. Um dia ela voltaria. Um dia voltaria.

Marisa Piedras
Enviado por Marisa Piedras em 21/10/2013
Reeditado em 24/10/2013
Código do texto: T4535733
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