Na hora da empolgação
Quando chega o tempo do Advento, as ruas, casas, cidades mudam o visual. Há muita luz, objetos coloridos que a tudo enfeitam e deveriam nos chamar para a conversão e reflexão sobre o excelso mistério da chegada do Menino Deus - “Emanuel, Deus conosco”. Trouxe-nos a paz e a salvação. Deu-nos o exemplo, nascendo numa manjedoura, de que não se fazem necessárias tantas coisas materiais para que o homem seja feliz.
É neste clima que a gente prepara o coração aguardando a vinda do Senhor. Dá gosto ver como as pessoas se tornam mais solidárias. Bom seria se assim fossem o ano todo. E junto vem bem forte o apelo ao consumismo. Parece inevitável abastecer as prateleiras com os alimentos próprios da época, preparar as comidas, arrumar a casa para receber convidados. Quanto aos presentes precisa-se planejar e agendar a hora para comprá-los. Antônio queria antecipar as compras e chamou-me para ir a algumas lojas no centro da cidade. Fomos descendo a Rua Goiás. O movimento era intenso tanto quanto o calor. Parecia que todos também naquele momento resolveram comprar os presentes de Natal.
Enquanto caminhávamos, Antônio contou-me que fora visitar a irmã no dia anterior e ficara triste porque ela não reagia aos tratamentos. Altair ficara viúva, entrou em depressão e veio morar em Divinópolis no Lar dos Idosos. Apesar de todos os tratamentos, dos cuidados a ela dedicados pelas enfermeiras, médicas, terapeutas, psicólogos, a sua tristeza era um sentimento constante. Altair não queria se alimentar, não dormia e por fim não queria tomar banho. Antônio aconselhava-a e pacientemente recomendava-lhe o banho. A gente torcia para que ela superasse aqueles momentos difíceis e ainda pudesse ter uma vida com mais alegria.
Foi contando-me, revivendo a cena, e eu escutando:
- “Ontem, eu perdi a paciência porque a Altair não colabora com as enfermeiras e com as ajudantes. Não estavam conseguindo levá-la para o banho. Falei bravo mesmo com ela.” Enquanto me contava foi empolgando, elevando a voz e gesticulando:
- “VOCÊ NÃO QUER MAIS TOMAR BANHO, SUA PORCA? ESTÁ FALTANDO ÁGUA PRA VOCÊ? ESTÁ FALTANDO SABONETE? O QUE VOCÊ TEM NA CABEÇA? PRECISA, SIM, TOMAR BANHO TODOS OS DIAS!”
Foi aquela situação constrangedora pois quem passava, nos olhava com curiosidade e espanto, julgando ser eu a porca que não queria tomar banho!
E eu só despistando:
- É mesmo? Que situação hein?
E apelei aos céus: “ Vem socorrer-me depressa, meu Senhor, minha salvação!”
***
Caro amigo, seria bem melhor que fosse mesmo a outra empolgação!
"Bem na hora da empolgação
uma outra coisa eu pensei
mas só Freud traz explicação
daí a última frase deletei..."
Brazílio
***
Frei Dimão insiste nos conselhos:
A hora da empolgação
tem eucarístico sentido
quer dizer libertação
de toda e qualquer libido. – Frei Dimão
Quero fazer um alerta
Ao bondoso Frei Dimão
O que fala me desconcerta
E eu entro em alucinação. - Nanda
Por isso eu sempre insisto
na pregação clara e cristã
melhor a rota de Cristo
do que a jornada pagã. – Frei Dimão
Esta rota que o frei prega
É difícil de prosseguir
Se aconselha a total entrega
Sei que não vou conseguir. - Nanda
E enquanto o terço debulhas
entre uma e outra jaculatória
vais sentido as veras fagulhas
da fogueira da mais alta glória. – Frei Dimão
Existe um ditado antigo
Que todos devemos saber
Aquele que ama o perigo
Nele é que vai perecer. - Nanda
E é neste santo abrasamento
que irás comigo confessar
e tudo o quanto é tormento
de tua alma irei exorcizar. – Frei Dimão
É justo aí que está o perigo
Confessar com o Frei Dimão
Ganharei um bom castigo
Se o confessor for adivinhão. - Nanda
Usaremos o divino altar
como a mais ardente ara
que em leito há de virar
pra expulsar de ti toda tara. - Frei Dimão
Se a tara não tiver cura
O que fará Frei Dimão?
Insistirá na benzedura
Ou fará uma alteração? - Nanda
Honra pois minha admoestação
para na rota prosseguir
segura minha vara então
para teu mundo não mais ruir. – Frei Dimão
Parece que estou vivendo
Uma grande alucinação
E o que estou mesmo querendo
Dos pecados a absolvição. - Nanda
E livre de todo o pecado
e de qualquer tentação
traz assim teu corpo sagrado
pra minha sacra comunhão. – Frei Dimão
Aí é que estarei em pecado
Nesta rota de agarração
Pois este ilustre prelado
É uma grande tentação. - Nanda
***
Veja o que me diz a Thays:
Nanda prezada
não sei
como vc tem
tanta paciência
de aguentar
esse frei
co'a xaropada
eu no seu lugar
só faria impertinência
pra esse frei
de batina arriada
Thays Freganno Pinto
***
Thays,
Quer que de ti me compadeça?
Não me vem com seus queixumes
Pois nada me tira da cabeça
Que você sofre é de ciúmes. - Nanda
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Nanda vai fazer um retiro com Frei Dimão com promessas de indulgências:
Comigo vem pro retiro
espiritual na sua essência
sabes bem a que me refiro
e isso vale plena indulgência. – Frei Dimão
Falou que tem indulgência
Coloca meu nome na lista
Não vou fazer resistência
Ao retiro que se avista. - Nanda
Já andaste de seca e Meca
à procura duma paixão
e nesta vida só quem peca
é quem deixa de me dar a mão. – Frei Dimão
Suas mãos abençoadas
Sei que fazem muita proeza
Ao longo das caminhadas
Nos acodem com presteza. - Nanda
Se me acompanhas na clausura
terás somada penitência
pois lá faremos a leitura
sob jejum e muita abstinência. – Frei Dimão
Quando fala em clausura
Eu sinto até um arrepio
Lá tem muita diabrura
Mas aí eu me silencio. - Nanda
E o que é mais importante
deve agora ser lembrado
examina pois um instante
de segurar no meu cajado. – Frei Dimão
Só segurarei o cajado
Se feito de bela madeira
E será bem abençoado
Por esta grande faladeira. - Nanda
E terás então primícias
só aos mais santos reservadas
gozarás pois das delícias
mais altas e mais exaltadas. – Frei Dimão
Esta promessa de Frei Dimão
É por demais tentadora
Terá minha aprovação
Se for santa e consagradora. - Nanda
Uma coisa contudo prometerás
sob o mais sacro juramento
nada de namoros de sofás
e castidade a cem por cento. – Frei Dimão
Eu prometo de pé junto
O que for para o meu bem
Abençoado seja nosso assunto
E os anjos dirão amém. - Nanda