Estômago

Vi gente entrar e sair daquela universidade. Nesse tempo, contabilizei seis anos da minha vida me dedicando ao curso de jornalismo. Hoje, aos 25, e sofrendo de envelhecimento precoce vide os meus cabelos brancos, percebi que, por Deus, finalmente estou encerrando mais um ciclo.

- Já estava em tempo!

Foi quase como um colegial inteiro - mas só com as partes boas, é claro. Sem buylling, sem tarefas de casa e sem acordar naqueles horários inconvenientes.

Engordar doze quilos foi o primeiro sintoma da grande mudança. É que na escola eu costumava juntar o dinheiro que papai dava para o lanche, e comprava os livros indicados pro vestibular – coisa que eu faço questão até hoje, ter o máximo de obras que eu puder (é uma compulsão). E na universidade minha única ambição era comer yakissoba com a turma. Pronto, virou moda e lá se foi a minha silhueta.

Depois, vieram as cervejinhas, a primeira transa, fumar escondido evoluiu para um hábito, a carteira de motorista, o primeiro carro e aquele maldito dia que levei gaia de um antigo namorado e Maysa começou a fazer todo o sentido: Meu mundo caiu...

- Ah, se esses corredores falassem... - diz a amiga de longa data, lembrando das paredes do velho bloco A.

Aí, precisada de um descanso nessa meia dúzia de tempo, peguei todo mundo de surpresa e resolvi ir embora. Desbravar outras coisas, ver além do sertões. E eu achava mesmo que era pra sempre - e talvez ainda seja - mas tudo tem sua hora. E lá se foi mais um ano. Vi 2012 ir embora e 2013 chegar a galope.

O ano mais rock n' roll da minha vida. Eu aprendendo até a lidar com a saudade e passando sufoco como estudante, trabalhadora e dona de casa.

Mas um tempo que, só eu sei, foi fundamental pra chegar nesta quinta-feira de pré-feriadão e pensar no quanto vou sentir falta de tudo isso.

E naquela última sessão do meu penúltimo semestre na universidade, o assunto era justamente a crônica. A turma lia, entretida, textos geniais de bons cronistas brasileiros. Mas no meio do alívio de alguns, talvez por ser o último dia de aula, meu estômago se revirava todo por dentro.

Eu queria rir dos textos também. Participar do contexto e achar graça nas anedotas. Mas, pasme, minha boca nem se mexia.

Eu estava completamente abduzida com a ideia do fim.

A cadeira de madeira, o vento forte da janela ao lado, o ventilador no teto, e o barulho que vinha de fora da sala e a professora tentava lutar contra. Era aquela cena pela última vez. E eu pensava, seriamente, no que eu queria guardar dela.

Talvez a lousa riscada com as letras gordinhas da professora simpática. O barulho dos iPhones ou a empurrada de perna que aquela aluna chata sempre dava na entrada porque chegava atrasada. Ou mesmo os elementos sonoros como a risada da turma ou alguém miando pra conseguir uma falta a menos na chamada.

"É possível que eu tenha ficado tempo demais aqui e agora sinto uma espécie de síndrome de Estocolmo da universidade." - Pensava eu, ao longe na terra das imaginações distantes.

- Para a última atividade, vocês vão produzir uma crônica de 15 a 25 linhas. - Sinalizou a professora.

Ao ouvir a informação, fiquei pensando que talvez eu pudesse escrever sobre peixinhos amarelos, bolinhas vermelhas ou a minha vontade de provar a existência de alienígenas e dinossauros. Mas era impossível falar de outra coisa quando minha mente só pensava em finais.

Então, meu estômago pulsava mais forte. Parecia fome, mas não era. E dessa vez também não tinha a ver com paixão!

Aí caiu a ficha de que as náuseas eram reflexo do meu estado de espírito. Eu respondia pelo estômago... E nesse caso, a saudade e o medo pungentes queriam me dizer alguma coisa.

"Táááá chegaaaando a hoooora..." - Veio a calhar aquela musiquinha meio irritante, meio profética.

Eu já podia ver o projeto de conclusão de curso me pegando pelas mãos, me ninando, e eu me despedindo daquela que foi minha casa durante seis anos - e que espero voltar.

"Pois é... Dava até pra eu ter feito medicina..." - Acordei!!!

Aline S Silva
Enviado por Aline S Silva em 16/11/2013
Código do texto: T4573202
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