Parábola

Parábola

Estava eu sentando, cogitabundo, comendo a maçã que mudou o mundo e lendo o discurso que reconstruiu o homem. Meu corpo e minha mente viveram separados por longo tempo, mas, agora, é um só e vive acreditando nas metáforas que dão forma ao mundo.

Estava eu sentado, lendo os rascunhos das leis que julgam e condenam tudo que foge à regra e a determinação do contrato. Buscava ,eu, lacunas nas frases proferidas e repetidas infinita vezes. Há lacunas? Há lacunas!

Estava eu sentado, colhendo a luz e correndo em pensamento em sua velocidade; todavia, outra luz brilhou e ofuscou a visão da existência.

Comi a maçã e fui expulso de mim, mas, a mesma maçã serviu de cálculo e, também, de marca de vencedor. O oráculo afirmou que Dona Cassandra falou mal de mim. Disse que há mais sábios na Grécia que no Haiti. Fui à praça e apanhei de um velho que me ironizava e me fez parir minha ignorância. Bradei alto minha estupidez e tornei-me platônico, todavia, às escuras, em meu quarto, penso em desejos lascivos.

Estava eu sentado, pensando na falta de luz que o mundo viveu. As pessoas se esbarravam na escuridão e tateavam segurando o corrimão imposto pela subjetividade. Acenderam a luz; iluminaram a escuridão e, novamente, ofuscaram todos com a infalibilidade e a certeza. O trono ganhou outro rei, mas quem foi rei jamais perde a majestade. O rei sempre esteve nu. Mas ficar nu é condenável. Vista a roupa e esconda seus segredos. Corpos sendo vestidos por grifes impostas.

Estava eu sentado, tentando responder questões simples sobre o que é. Risquei algumas linhas e respondi com uma pergunta. Quem sou? Outra pergunta ecoou e não ouvi. Quem pode esclarecer se esconde em off nas redes sociais da existência.

Estava eu sentando, olhando o encontro de céu e terra e pensando no desencontro de vida e morte. A morte precisa da vida para que se mantenha mais viva.

Estava eu sentado com as pedras largadas pelos pecadores e arremessei algumas em direção ao sagrado; sangrei e bebi o sangue. Tenho fome; comi o pão. Servi da ceia até as últimas migalhas, mas percebi que negar três vezes é amar três vezes. Tudo na ordem estabelecida. Comprei uma algema com trinta moedas. Deram-me um beijo e me traíram com a servidão.

Estava eu levantando, quando o silêncio das reflexões me indagou:

- Ei, é lícito pagar o céu com a vida?

Olhei para o meu corpo castrado pela violência do discurso e falei:

- Dê ao céu o pecado e à vida, o prazer.

Mário Paternostro