Fotos Numeradas

Ha alguns dias, distraidamente, folheava um jornal. Ficou impressionado com o número elevado de fotografias. Eram umas fotos pequenas com um nome, algumas escritas que ele não decifrava, pois era analfabeto, e tinha um número em cada uma, deveria ser, segundo sua interpretação, a data ou coisa assim. O fato é que acostumou a vê-las diariamente. Às vezes, encontrava desenhos (era como chamava) de pessoas conhecidas. De manhã, acordava, e ia direto ao jornaleiro, voltava para casa e ficava lá: uma, duas, três..., até chegar a dez, o máximo que sabia contar. É verdade que havia algumas sem números, outras nem eram de pessoas. Mas o interesse estava mesmo nas numeradas.

Um dia saiu para pegar sua habitual pinga. O dono do armazém não vendeu. Era dia de eleições, bebida alcoólica, não poderia ser comercializada, a não ser em uma garrafa das pequenas dando a entender, se por acaso surgisse alguma autoridade, que estava bebendo refrigerante. O vendedor ainda disse que era seguro, muitos faziam assim e nada acontecia. Só não vai beber muito e esquecer de votar, concluiu o atendente.

Na verdade havia feito titulo (era analfabeto), mas não sabia como proceder, nem o próprio nome sabia escrever, quanto mais aqueles complicados que haviam nas disputas do voto. Além do mais não ia ganhar nada com isso, afirmou. E assim foi. Bebeu o dia todo. Realmente não votou. No outro dia foi ao jornal e não mais viu as fotos numeradas, sua atenção principal. Aquelas folhas estavam perdendo a graça. Caminhava pelas ruas desesperado “quero novas eleições” berrava ele em seus apurados passos. Todos pensavam que sua inconformidade era devido á derrota de seu partido. Estaria preocupado, possivelmente, com os gastos feitos, e agora, derrotado, não veria nenhum sinal de retorno.

Aqueles gritos eram diários e passavam desapercebidos. Os vizinhos apreenderam a conviver com eles. Um dia, porém, passava por ali um visitante. Vendo o fato, consultou os amigos e foi falar com o moço:

-Meu caro, perder as eleições não é tão grave, não vejo motivo para o senhor ficar fazendo alarme pelas ruas. Quem sabe na próxima seu partido vença.

Evidentemente, não esperava por uma resposta tão espontânea:

-Quero novas eleições para ver as fotos nos jornais. E eu tenho partido por acaso?

Ficou ainda mais irritado e continuou a gritar.

Dayde W Nikolas
Enviado por Dayde W Nikolas em 20/12/2013
Código do texto: T4619446
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2013. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.