O diferencial da bucha

Quando criança não tínhamos o conforto que hoje usufruímos. O único sabão que usávamos era o preto que minha mãe fazia e nós ajudávamos a mexer o tacho e depois a fazer as bolas depois de pronto mas ainda bem quentinho. Ele era usado em todo o tipo de limpeza doméstica. E com a bucha vegetal formava um casamento perfeito neste processo de higiene.

A bucha - este fruto de uma trepadeira de origem asiática - cultivávamos no quintal. Ela foi introduzida no Brasil pelos africanos e muito bem se adaptou às condições de solo e clima de nossa terra. A gente sabia que a bucha podia ser colhida quando a casca estava amarelo-castanho. Cortávamos o cabinho e, durante alguns dias, ela ficava secando para que as sementes se soltassem. Arrancávamos a casca e depois batíamos a bucha em algum lugar firme. Era uma festa ver as sementes se escapulindo e caindo longe.

Aí a bucha era cortada em duas partes, recebia um banho de água quente para amolecer as fibras e começava sua labuta. Um pedaço era reservado para o banho, trabalho que exercia com muita eficiência. A outra parte era para a lavagem dos vasilhames da cozinha. Para lavar bem as panelas, usadas no fogão a lenha, a bucha recebia a ajuda de areia fina para tirar a barrela porque esponja de aço não havia lá em casa. Depois da cozinha arrumada aquele material de limpeza – bucha, sabão preto e areia – era guardado debaixo da pia dentro de uma cuia.

Minha mãe era uma ótima administradora dos serviços domésticos. A cada semana fazia rodízio de todas as tarefas rotineiras distribuindo-as entre nós, as cinco filhas.

Um dia, chegou a vez da Maria Elena lavar o vasilhame do jantar. A cozinha já estava meio escura. Nossas lâmpadas incandescentes eram fraquíssimas e pouco iluminavam aquele ambiente de fogão de lenha. Da janela da cozinha avistávamos o quintal que, a esta hora da noite, era puro breu e nós crianças tínhamos medo só de olhar para ele. Então minha mãe escalava uma outra das meninas para sentar no banco perto da pia e ali permanecesse enquanto durasse a lavagem das vasilhas.

Maria Elena recolheu todo o vasilhame usado no jantar e foi pegar a bucha em baixo da pia. Como era seu costume, antes de usar a bucha, espremia-a para tirar o excesso de água que por acaso tivesse. Apertou e a “bucha” esperneou! O que ouvimos foram os seus gritos desesperados. Era um sapinho que, tão assustado quanto minha irmã, pulando rapidinho alcançou o quintal e sumiu na escuridão.

fernanda araujo
Enviado por fernanda araujo em 15/01/2014
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