Quer Morar comigo?

Naquele dia não sei porque estava com um pouquinho menos de dor e um pouquinho mais de esperança.

A minha relação cheia de retornos e separações dessa vez tinha terminado para sempre. Ele ia se casar e não era comigo. Quando ele me contou, não sei como, eu desejei felicidades e até enviei um telegrama ao casal. Acham que sou fria, ou que não sentia nada por ele? Não, minha mãe me deu excelente educação.

Depois do trabalho estava assistindo como ouvinte às aulas de um cursou que eu estava começando a me interessar. Eu sabia que era ali que eu iria encontra-lo. Não me perguntem como mas eu sabia exatamente quase tudo a seu respeito à não ser sua fisionomia e seu endereço e telefone.

Ainda bem que tinha contado essa maluquice a duas ou três amigas se não ninguém acreditaria. Foi ela, ou ele, não sei bem, que salvou a minha vida. Eu ia sempre às aulas esperando vê-lo, mas até aquela noite fria e chuvosa não tinha tido sucesso.

O professor pediu que um aluno lesse um texto, o nome dele era Luís Alberto. Até então eu de desanimada passei a encantada quando ouvi a sua voz e imediatamente reconheci quem eu procurava. Eu sabia o seu nome mas não tinha prestado atenção quando o professor o chamou. Sabia o seu sobrenome, que era promotor, carioca, trinta e três anos, dois filhos, que não gostava de Brasília, e que andava meio deprimido.

Os dias foram passando sem que nada acontecesse entre a gente. Conversando com a Marli, uma amiga, falei a respeito dele, rindo me perguntou porque não telefonava para ele. Ligar para que número, não sei onde trabalha. Você sabe tudo sobre ele e não sabe para onde telefonar? Ligue para o meu número no Ministério Público e peça para falar com Dr. Luís Alberto, e a propósito ele mora na Quadra 210 Norte. Fiquei sem entender nada. Como sabe? Ele trabalha comigo. Só não sei o telefone da casa dele, mas isso você descobre.

Contei para Marcela, uma outra amiga, ela ficou estupefata. Como você faz essas coisas? E dei a resposta de sempre, não tenho a menor idéia. A essa altura quase todas as minhas amigas já sabiam da estória e todas queriam conhecer o Dr. Luís Alberto que eu tinha sonhado e ele tinha se materializado.

Elas começaram a se revezar cada dia uma me buscando no curso, era muito engraçado. Às vezes uma ficava hipnotizada por aquele homem com cara de anjo e começava a elogia-lo demais. Tinha que lembrar, eu vi primeiro.


Estava meio cansada daquela situação em que nada acontecia, tinha só duas semanas de aula, mas para mim parecia uma eternidade. Um dia bem concentrada pensei, se você não vier falar comigo hoje , vou sumir da sua vida e nunca mais me verá. Na hora que eu ia embora ele segurou o meu braço e falou que estava na hora do luto acabar, que eu ia ficar muito mais bonita com roupas mais claras e coloridas e com um btom e esmalte cor d rosa. Foi nesse momento que percebi que desde que o Paulo tinha ido embora que eu só usava roupas, batom e esmalte pretos e meu apelido no curso era miss Dark. Respondi que na próxima semana estaria sem o luto e fui embora.

A Marcela que dava jeito em tudo, conseguiu o telefone da casa de um promotor que tinha sido ameaçado de morte algumas vezes, simplesmente ligando para o Ministério Público dizendo ter uma encomenda para ele e que precisava confirmar o endereço e telefone, deu o endereço certo, que ela sabia, e o telefone inventado, a pessoa que atendeu corrigiu o número, fácil assim. Quando cheguei em casa tinha essa surpresa na minha secretária eletrônica.

No sábado a noite eu estava meio triste e desanimada e a Marcela como sempre estava lá em casa. Liga para ele. Eu não. Então eu vou ligar. De jeito nenhum. Então liga para Giselle, uma outra amiga minha que tem solução para tudo, mais ainda que a Marcela. Para que? Para ela ligar para ele. Está bem Marcela, vou dar o numera para Gi. Quarenta minutos depois ouço aquela voz maravilhosa do outro lado da linha. Tenho o seu endereço, se arruma que eu vou te buscar. Só consegui responder, está bem. Ele sempre gostou de me dar ordens. Quando estava quase pronta ele chegou com o capacete na mão. Olhou-me de cima em baixo... Eu vestia uma calça e uma blusa de lã preta. Você vai sentir frio. Coloquei um casaco de lã cinza por cima e um de couro. Você vai sentir frio, respondi que não, estava bem agasalhada. Nunca senti tanto frio em toda a minha vida.

Quando nós descemos me olhou nos olhos e disse: Parece que eu te conheço a minha vida inteira e eu te esperei a minha vida inteira, onde você estava? Esperando por você, eu também te conheço a minha vida inteira.

Fomos para sua casa. Depois de analisar o apartamento dele e comparar com o meu, que teve a curiosidade de observar enquanto eu me arrumava, parou no meio da sala e falou que achava melhor nós morarmos no apartamento dele, já que sua varanda era maior e precisava dela para o seu segundo hobby, bonsais, e da garagem também maior para o primeiro, motos Harley Davidson, ou que podíamos por enquanto morar nos dois.

Depois de decidir isso perguntou e respondeu: Você vai morar comigo não é? Claro. E me deu um beijo para selar sua decisão. 



Suzanna Petri Martins
Enviado por Suzanna Petri Martins em 26/04/2007
Reeditado em 27/08/2007
Código do texto: T465310