O MST sob a ótica de Cléria Botêlho

A obra de Cléria Botêlho "A arte silenciosa do Movimento dos Sem-Terra" apresenta um discurso contextualizado e poematizado de indivíduos que são "amantes" de sua terra, ou melhor, sendo eles o corpo onde habita a alma, a essência de sua terra. Cléria Botêlho nos apresenta o MST (Movimento dos Sem-Terra) de forma totalmente contrária à mídia e a outros órgãos que, de forma distorcida, mostram esse movimento social como um grupo composto por vândalos etc.

Na realidade quando estudamos o MST, notamos que seus integrantes de forma organizada buscam difundir as suas ideologias. A narrativa contextualizada de Cléria Botêlho nos apresenta outro lado do movimento, onde fica visível a presença da poesia, ou seja, da arte gritante que mantém viva a centelha do movimento. A poesia é uma das formas mais precisas que utilizam para engendrar a sua mensagem, seja ela discursada para um grupo maior de indivíduo, ou narrada como falas no cotidiano.

Linguagem simples e acessível

Cléria Botêlho nos faz lembrar da oralidade, um instrumento utilizado pelos africanos, objetivando manter a sua história viva, em um contexto onde os griots, os anciões detentores das histórias, transmitem a mesma para seu povo. "O mesmo ocorre no movimento sem-terra", os líderes do movimento ou adeptos veteranos utilizam da narrativa poética para transmitir a mensagem, eternizando uma história dentro de uma linguagem simples e acessível para os seus integrantes.

A narrativa poética é um elemento de grande importância para os integrantes do MST que historicamente narram a sua individualidade e ao mesmo tempo eternizam os fatos coletivos de forma coerente e realmente vivida. É nítido que a narrativa poética dos integrantes do MST tem também como referência a prática de descrever a sua nacionalidade, a memória histórica de cada indivíduo que mesmo lutando pela terra sonhada vivenciam particularidades distintas: as diferenças existem dentro do movimento, a ideologia pode ser a mesma, mas a compreensão, a visão é algo particular, restrita e por que não íntima.

De silenciosa nada tem

Podemos ir além, e perceber que a arte silenciosa do movimento, de silenciosa nada tem, pois dentro da organização do movimento é visível o poder do discurso que bravamente defende uma nacionalidade que funde com sua ideologia. O constante lutar pela terra é o que mantém aquele povo vivo. Assim percebemos que a arte de expressar os momentos por meio dos poemas pauta-se na luta, na emoção, no imaginário, nos ritos, nos mitos, fatores fundamentais para perpetuar um ideal coletivo de um movimento resistente.

O mito da conquista de um espaço sonhado e idealizado é o que mantém a alma desta gente viva, como afirma Platão "os mitos mantêm os homens vivos". Problematicamente notamos ao longo da análise da obra de Cléria Botêlho que simbolicamente "os sem-terra não existem sem a sua terra". A terra simplesmente engendra a vida que os impulsiona na luta diária, a terra é exclusivamente o seu lutar de memória história.

Como muito bem trabalha o filme cubano "Morango e chocolate", a expressão artística é um dos recursos que de forma silenciosa mantêm vivo o ideal, seja ele coletivo ou individual. A obra de Cléria Botêlho nos faz remeter ao filme, pois ela nos apresenta um discurso que descreve a memória histórica do MST que silenciosamente solidifica a sua ideologia através da oralidade, fecundando o amor pela terra, o desejo por justiça, a concretização da terra como lugar de memória histórica e o anseio por igualdade social.

Dhiogo J Caetano
Enviado por Dhiogo J Caetano em 18/01/2014
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