Um bilhete na geladeira

Dois empregos, a maior correria... De dia eu era a cinegrafista de uma produtorazinha sem vergonha e a noite, eu me transformava na recepcionista de um Pronto Socorro infantil...

Isso me ensinou que trabalhar com festas é infinitamente melhor do que trabalhar com doenças...

E que venha o forró ensurdecedor, a mãe da noiva que é a maior chata da paróquia, o pai da criança de bota ortopédica que deixou sua marca em minha canela no seu aniversário de 4 anos, que venha, não tem importância...

Mas que fique longe a bronquite, meningite, rinite, nefrite, sinusite e esse monte de "ites" que não prestam...

Nesse corre-corre, pega-pega, minha filha foi crescendo... Entre durmidas escondidas no Pronto Socorro porque ninguém "podia ficar", e brincar de Barbie as 4 da manhã... Ela foi crescendo...

Costumo dizer que foi de teimosia mesmo, sem um arranhão, minha princesa de torna mulher... Assim, aos pouquinhos...

Comigo foi diferente, durmi criança e acordei adulta...

Me lembro que a primeira coisa que eu fiz foi jogar minhas revistas "Capricho" no lixo e comprar uma "Pais e Filhos"...

Uma besteira, mas pensando bem, creio que faria igualzinho se fosse hoje...

A mãe adolescente parece que deu conta do recado...

Num dia basicamente corrido, me vi obrigada a apelar, parece que na maioria das casas a geladeira se tornou uma espécie de P.A.B.X, uma central de recados, um mural...

No bilhete da geladeira eu escrevi:

"SE DER, LAVE A LOUÇA! OBRIGADA!"

No dia seguinte, o bilhete na geladeira dizia:

"NUM DEU. DE NADA"

Hoje, vejo que valeu a pena a quantidade de forrós, de mães de noiva, de chutes na canela, de nefrites, sinusites e bronquites...

Faria tudo exatamente igual...