A Lagartixa e Eu

Era um dia normal como outro, levantei-me e fui trabalhar, no trabalho algumas desavenças matinais me corroíam, mas, eu me fazia de incorrosível. Estava muito quente, é que eu moro no Rio e era época de Janeiro, mês de desastres, seja de chuvas, de sol, de amores, de falsas promessas do ano novo, sempre tem. Eu tenho uma vida calma, sou uma mulher quase que perfeita, tenho um bom marido, uma boa casa, lindos filhos e uma boa empregada. Mas algo nesse dia que a mim parecia que seria normal, me deixou estranha, e desde já eu não consigo mais pensar em nada, só no assassinato que eu cometi, a pobre da Lagartixa me pegou de surpresa, sabe-se lá quando vamos nos deparar com isso? Eu tenho medo de Lagartixa, não que ela me tenha feito mal, mas pelo que ela me faz ver. Nesse mesmo dia, cheguei do trabalho exausta de calor e de falsidade, corriqueiramente liguei a lâmpada e sentei-me em minha cama, ao sentar, ela desesperadamente saiu, parecia que ela tinha passado a noite comigo, foi minha companheiro, sonhamos juntos, é$ramos amigas de anos, igual eu era da Jaqueline e da Raquel, que me deixaram triste pela traição, mas, a pobre da Lagartixa saiu rapidamente, ela parecia ter saído de mim, eu a assustei, fiz muito mal a ela, ela só estava repousando em mim!

Não contente com o espanto que causei, eu ousei tirar meu revolver, minha arma, minha força, fui covarde, retirei meu chinelo e não pensei duas vezes, eu a matei com todas mas minhas forças, mas o meu medo não foi ter matado só, eu poderia ter matado com a força que usei uma vez só, mas repeti várias vezes o movimento e cada vez mais forte, parecia que eu estava desabafando com o pobre bichinho, coitadinha, revelei-me uma maníaca de Lagartixas. Morta, sem vida, sem alma, sem espírito, sem Deus, eu parei na dimensão cósmica, e fiquei olhando para a Lagartixa, ela me dizia algo, e com revolver na mão, parei! Não pensava mais em nada, somente no que eu tinha feito, na raiva e no meu espumar de boca, é que eu estava morrendo ali. Eu estava na Lagartixa, e ela estava em mim, e naquele momento passamos do Cosmos, saímos de tudo e entramos em nós mesmos. Perguntas existências me rodearam, por que eu a matei? Por que sou esse assassino? Por que mais de três chineladas? Por que tanta raiva e espanto em mim?

Descobri minha inquietação ali, descobri minha imperatividade ali, soberba, todas as sujeiras que sempre me falaram e me neguei a acreditar, eu estava o tempo todo em um quarto existência, na companhia das minhas amigas poeiras existências, com minha fé inexistente. Eu era a Lagartixa oprimida, eu era a Lagartixa que se escondia, que se perdeu quem sabe e que na primeira oportunidade saiu da toca e morreu, ou assustado do primeiro barulho saiu e morreu, mas ela morreu em todas as suposições e eu morri em todas as situações.

Com pesar e ressentido, tirei o pobre cadáver dali, e joguei de minha janela, como se fosse um papel. Eu era o papel, o chinelo, a vontade o medo! Fechei a janela, e sentei-me na cama. Fiquei horas e horas ali, refletindo, pensando, mudando, mudei. A Lagartixa que matei era o filhote, será que a mãe se encontra no mesmo lugar? Cassei e procurei a noite toda, queria pedir desculpas, mas era tarde demais. No outro dia, quando acordei, me deparei com uma Borboleta pequena, e sem pavor e com paciência eu a espantei do quarto, e a levei para fora, senti-me aliviada, descobri que tenho jeito.

Arthur Montenegro
Enviado por Arthur Montenegro em 28/01/2014
Código do texto: T4667628
Classificação de conteúdo: seguro