O Escritor Lutador Bill Larson

(Luiz Pádua)

Bill Larson estava nesse momento pondo sua mente à prova à frente de uma máquina remington, às voltas com um texto que iria fazer parte do seu próximo livro.

Bill era um homem dono de um físico privilegiado, ombros largos, noventa quilos, um metro e oitenta e nove de altura, e saúde perfeita. Fora uma bela máquina de boxear, conseguindo sobreviver aos rigores de uma vida amarga e de pobreza da família. Sua aparência é um retrato do eloqüente testemunho da vida que levou. Seus cabelos crespos cortados curtos já começam a escassear na frente. Seus lábios estão quase disformes e seu nariz é achatado e quebrado. Acima dos olhos esverdeados que fuzilam quando ele está bravo, há uma cicatriz, resultante de lutas pretéritas.

Pelos padrões mais caritativos, não se pode chamar seu rosto de bonito, ou esteticamente agradável. Bill tem um rosto que reflete toda a sua vida; ao mesmo tempo, rosto moço e velho marcado pela violência. Com o nariz quebrado e arqueado, testa enrugada, olhos fuzilantes e rajados; sua insolência diante do perigo parece uma ave de rapina.

Entretanto, uma observação mais apurada revela em Bill uma qualidade perturbadora que sugere dualidade paradoxal, pois ele tem rosto capaz de desarmar com um sorriso, ou de abrir-se num riso de bom humor. quando partido por um sorriso cômico ou enrugado pela risada, torna-se amigável, despido de qualquer expressão que possa causar medo. Pode-se também ver que o dono daquele rosto, se diverte com sua presença e desagradável aparência. Ele ainda não tinha trinta anos de idade, mas aparentava quarenta ou mais.

Bill nasceu de um complicado parto o qual não se dava a ele o mínimo de esperança de salvação tanto da mãe como da criança que estava para nascer. Mas não houve mais complicações, sua mãe sobreviveu forte e sadia, o garotinho era gorducho, alegre e de cabelos dourados.

O tempo se passava e tudo corria às mil maravilhas para a pequena família de Bill. Desde a hora que ele nasceu deu provas de sua precocidade. Quando ainda devia estar engatinhando, já se equilibrava perambulando pelos corredores de sua pequena casa.

A meiga Katie, mãe de Bill, muito cedo o apanhou tentando decifrar palavras de um livro, e lhe ensinou um divertimento fascinante: a leitura e a escrita; Katie e seu marido faziam tudo isso juntos. Bill estava fascinado com o “coupê” de seu pai e queria saber por que ele corria. Ouvia com atenção as explicações simplificadas de seu pai sobre o princípio de combustão interna dos motores.

Pois bem, o tempo passou e Bill crescera. Mas como o mundo não perdoa, primeiro, faleceu sua mãe vítima de um derrame cerebral; posteriormente, faleceu seu pai em um acidente automobilístico.

Bill já havia completado dezenove anos, e estava praticamente sem ninguém que pudesse guiá-lo para um caminho que pudesse trabalhar e ganhar o seu sustento. Vivia pelas ruas batendo de porta em porta das Editoras tentando uma oportunidade para ser escritor de qualquer forma, tinha gabarito para isso e pretendia escrever um livro. Mas fora recusado em todas as Editoras nas quais batia à porta, só ouvia um sonoro não. Ele estava perdido sem saber o que fazer para encaminhar sua vida.

Nesse instante ele caminhava por uma rua do bairro onde morava, cabisbaixo e pensando no seu futuro, mas era no lugar e momento errados. Sem esperar, uma “gang” de adolescentes formada por três rapazes, cruzou o seu caminho. Não teve outro jeito, lutou com a turminha de três e derrubou todos.

Nesse exato momento passava por ali um senhor de chapéu branco, que parou para ver a luta. Era o Grand David, antigo e famoso lutador de boxe e que mantinha uma academia para treinamento de novos lutadores. Depois de terminada a luta, Grand David convidou Bill para tomar um café e aproveitar para se conhecerem melhor. Bill muito desconfiado, mas curioso, queria saber do que se tratava e o acompanhou.

Tomaram um café e passaram a conversar. Grand David perguntou ao Bill se lhe interessava treinar Box; oferecia-lhe um quarto para dormir, alimentação e alguns dólares para se divertir. Ele respondeu que sim, pois só assim ele poderia ter oportunidade de não sofrer tanto pelas ruas, batendo de porta em porta sem nada conseguir. Nessa altura ele toparia qualquer coisa para ganhar alguns trocados; precisava sobreviver.

Bill passou a treinar Box sobressaindo-se entre todos que também como ele, treinava na academia.

Logo depois de três meses, Grand David conseguiu uma boa luta para ele, já na categoria de profissional. Depois disso, outra e outras mais foram acertadas. Em todas elas ele saia vencedor. Depois de dois anos lutando profissionalmente, aconteceu a grande luta esperada pelo titulo dos pesos pesados. Lutou e saiu também vencedor. Sagrou-se assim o campeão dos pesos pesados de uma liga do Estado de Massachusetts. Defendeu seu cinturão ´por várias vezes; todos queriam acabar com a sua invencibilidade. Entretanto, mesmo sendo um invencível campeão, não faltava quem o desafiasse para uma luta fora dos ringues.

O tempo passou e Bill continuava lutando. Chegou a ganhar muito dinheiro. Até que alguém o incentivou a experimentar o maldito pó. Desde então passou a consumir a droga. O dinheiro que ganhava nas lutas, desaparecia de seu bolso como um passe de mágica. Sua idade aliada às drogas contribuíam para enfraquecer o seu físico. Passou a perder muitas lutas e só era escalado para lutar com lutadores mais fracos e iniciantes. De vez em quando Grand David lhe arrumava alguma luta para ele ganhar alguns trocados.

As coisas foram-se piorando cada vez mais, e numa noite ao caminhar pelas ruas defrontou-se com dois ex-campeões de box que queriam tirar a forra com Bill. Não houve jeito para ele se esquivar, pois os dois lutadores sem que ele esperasse o agarraram por trás, aplicando-lhe uma “gravata”, outro deles esmurrava sua mandíbula, enquanto o terceiro atacava seu fígado, queriam mesmo massacrá-lo. Quando Bill viu sangue escorrendo de sua boca e nariz, por um milagre suas forças se reativaram; deu um pontapé naquele que o estava esmurrando, e ao mesmo tempo aplicou um golpe no outro que o segurava, caindo os dois pelo chão. O lutador que apanhava de Bill, rapidamente levantou-se com uma barra de ferro na mão, pronto para quebrar-lhe a cabeça, Bill não teve como esquivar-se, segurou seu braço com a barra de ferro e aplicou-lhe um tremendo soco frontal; seu oponente foi parar no chão sem sentidos, e não se levantou mais. Seu comparsa quando viu que o companheiro estava inerte, saiu em disparada, pois a polícia chegou repentinamente, segurando Bill. Outro policial ficou mais distante e assistiu tudo, enquanto os tiras examinavam o rapaz estendido no chão.

“Está morto! Disse um dos policiais”. Chamaram o IML para levar o cadáver. Bill foi algemado e colocado no carro da polícia rumo à Delegacia. O tira que conduzia Bill, falou com ele no carro:

“Se o ferro o acerta, agora você e não ele é que estaria no furgão do IML. Legítima defesa! era você ou ele. Ninguém espera que um soco pode matar”. “Que soco hein”?

Na prisão, enquanto aguardava o julgamento por assassinato, sempre surgia alguém para desafiá-lo numa luta, derrubar um lutador profissional seria um grande prestígio.

Bill não era um sujeito que guardava raiva, e por essa razão, todos os outros presos passaram a gostar dele na prisão e procuravam sempre a ampará-lo de outros bandidos que gostavam de insultar-lhe para uma luta, para evitar que ele fosse parar na solitária. Por várias vezes ele foi para a solitária, por causa de brigas na prisão.

Não sabia ainda quantos anos ele ia tomar de cadeia, afinal, ele não matou por querer matar e nem sabia que o soco acumulado de todas as suas forças mataria o seu contendor, foi em legítima defesa. Mas não tinha nenhuma esperança de sair livre, esperava pegar no mínimo uns dez anos de prisão.

Bill estava em sua cela tristemente pensando na vida, mas na maior parte do tempo rabiscava alguns textos. Se um dia saísse dali, jamais voltaria ao vício e a lutar. Enquanto tais pensamentos tomavam conta de sua mente, um guarda chegou para levá-lo para uma visita.

Acompanhado de um guarda e algemado, chegou na sala especial. Qual não foi sua surpresa em ver seu antigo protetor, acompanhado por outro homem portando uma pasta preta. Grand David lhe apresentou seu acompanhante Dr. Welington que além de advogado era também um dos proprietários de uma Editora. O advogado foi logo lhe dizendo que não precisava se apavorar porque dentro de quinze dias ia haver o julgamento e que ele faria tudo para provar legítima defesa, como de fato fora, e contava com o testemunho do guarda que assistiu tudo, inocentando-o da morte do lutador. Havia ainda uma atenuante a seu favor: ele não portava nenhuma arma, fora apenas um soco para se defender de uma barra de ferro na cabeça.

Os olhos de Bill brilharam e um ar de satisfação brotou de suas faces. O advogado continuou a falar perguntando a ele se havia interesse dele quando ao sair da prisão dar uma chegada até à sua Editora para um teste de texto de um futuro livro. O advogado não precisou continuar falando, porque no mesmo instante Bill colocou as mãos no rosto e não conseguiu controlar o choro de tanta emoção. Não precisou responder à pergunta.

Dr. Wellington ao olhar para o lado admirou-se ao ver o Grand David com o rosto virado para o lado e um lenço cobrindo os olhos.

F I M

Luiz Pádua
Enviado por Luiz Pádua em 28/02/2014
Código do texto: T4710107
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