A BELEZA E A LONGEVIDADE DA POESIA DE e.e.cummings

Lendo os jornais diários de minha cidade, detive os olhos em uma página, onde um texto chamou-me a atenção. Era homenagem de uma filha à mãe, ex-professora, que acabara de falecer. As palavras, carregadas de dor, emocionavam.

Descrevendo a mãe, a filha destacou o amor que aquela senhora teve pelo esposo, ao qual sempre declamava um poema, amante que era, também, da poesia. Após a morte do marido, uma cópia do poema andava com ela, na bolsa, junto à foto dele.

Expôs o referido poema, dizendo que a mãe era leitora assídua de Cummings.

“Carrego seu coração comigo

Eu o carrego no meu coração

Nunca estou sem ele

Onde eu for você vai... “

(...)

Pus-me a pensar na suscetível grandeza da linguagem poética, a qual penetra a alma humana com tal grandiloquência, que se aninha na vida das pessoas e fica.

A beleza da poesia está em ela simplesmente ser. Desponta em meio a fatos e objetos, do nada transmutado em tudo, entre círculos coloridos, na fisgada de uma emoção qualquer.

Nessas essas divagações, vejo que Cummings, embora tivesse sido tão criticado em sua poética, até hoje penetra com sua poesia nos sentimentos de quem o lê. Significa, portanto, que a emoção é que importa ao leitor. E ponto.

“que o meu coração esteja sempre aberto às pequenas

que são os segredos da vida

o que quer que cantem é melhor do que conhecer

e se os homens não as ouvem estão velhos”

(...)

Chegam tendências e se vão como o movimento do mar. Algumas ondas são passageiras, outras duradouras, algumas até fazem escola e permanecem ao longo dos anos, passando por alterações de acordo com cada época. Nada em literatura é estanque ou muda de uma hora para outra. As transformações vão ocorrendo lentamente e se instalando, até que surja outra corrente literária.

Nada de novo até aqui, mas há determinados autores que fazem com que uma análise mais aprofundada seja necessária sobre seus escritos. É o caso de e.e. cummings, que assim mesmo assinava sua obra, fazia questão das letras minúsculas.

Tudo que é novo assusta e isto também não é novidade. Os escritores que surgiram com propostas diferentes precisaram suportar críticas e ignorá-las para que suas idéias

literárias fossem aceitas e reconhecidas. É o caso de Edward Estlin Cummings que exerceu grande influência sobre os poetas concretistas brasileiros e foi atuante na literatura americana como um dos grandes inovadores da poesia no século XX.

“que o meu pensamento caminhe pelo faminto

E destemido e sedento e servil

E mesmo que seja domingo que eu me engane

Pois sempre que os homens têm razão não são jovens”

(...)

Ezra Pound e T.S. Eliot influenciaram o renascimento das letras norte-americanas no início daquele século e destacaram-se no movimento Modernista da poesia. A inovação já vinha desde os primeiros poemas líricos de Joyce (de influência Simbolista), mas que apresentavam características visuais e objetivas, as quais os aproximavam do imagismo de Pound. A ruptura com a literatura tradicional já se evidenciava por volta de 1925.

Dentre os poetas “novos” influenciados pelos Modernistas, Cummings era um dos mais conhecidos. Rompeu com a técnica tradicional e introduziu importantes modificações sintáticas e na formação de palavras, estilo distinto com pontuação própria, seguindo a suas regras gramaticais. Por isso, foi hostilizado pela crítica e identificado como um iconoclasta social. Foi voluntário na 1ª. Grande Guerra e preso por engano, ele que tinha inclinação pacifista. Os horrores da guerra causaram impacto na obra de Cummings e em sua visão jovem e exuberante. Ao mesmo tempo, continuou valorizando tudo que era simples, natural, individual ou único. Foi capaz de expressar serenidade em resposta às belezas do mundo natural.

“teu mais ligeiro olhar facilmente me descerra

embora eu tenha me fechado como dedos, nalgum lugar

me abre sempre pétala por pétala como a Primavera abre

(tocando sutilmente, misteriosamente) a sua primeira rosa”

Como Joyce, Eliot, Faulkner e Pound, e.e. cummings gradualmente ensinou o leitor a ler sua obra repleta de inovações literárias e a ele a literatura muito deve da flexibilidade hoje introduzida nos versos.

Era também dedicado às artes visuais e pintou inúmeras telas, porém foi mais reconhecido como poeta que como pintor.

Tinha ascendência literária e intelectual por parte de mãe e foi educado em ambiente cultural, todavia rebelou-se contra a atmosfera dominada pela aprendizagem de Harvard e, influenciado pelo poetas novos, começou a escrever versos livres e criou um estilo próprio.

“(não sei dizer o que há em ti que fecha

e abre; só uma parte de mim compreende que a

voz dos teus olhos é mais profunda que todas as rosas)

ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas!”

Resistiu a tudo e a todos, passou por três casamentos mal sucedidos, suportou em silêncio os risos daqueles que o criticavam.

“Não ser ninguém-a-não-ser-você-mesmo,

Num mundo que faz todo o possível, noite e dia,

Para transformá-lo em outra pessoa

Significa travar a batalha mais dura

Que um ser humano pode enfrentar;

E, essencialmente, jamais parar de lutar”

Hoje, século XXI, leio nos jornais que uma senhora usava os versos de e.e.cummings para falar de amor com seu amado.

Ocorrem-me, então, as perguntas que não querem calar. A opinião dos críticos literários seria assim tão importante? Ou a importância da poesia é o que ela transmite ao leitor? Que magia há nos versos de cummings que permanecem ainda hoje falando alto em corações amantes.

Edward Estlin Cummings, simplesmente e.e. cummings, atingiu o objetivo primordial da poesia, que é alcançar e alma do leitor e emocioná-lo. Partindo do nada transmutado em tudo, falam melhor as emoções despidas de invólucros, através de límpidas palavras. Cumprindo puramente a missão de levar a poesia a ser.

http://pt.wikipedia.org/wiki/E._E._Cummings

http://en.wikipedia.org/wiki/E._E._Cummings

Dalva Molina Mansano
Enviado por Dalva Molina Mansano em 09/03/2014
Código do texto: T4721752
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