Elucubrações em uma faxina trágica

Tenho 55 anos. Ando só pela vida desde os 23. Gosto da solidão desde a infância. Mas aprendi o preço da minha escolha fazendo faxinas na minha casa.

Já escorreguei feio em um piso molhado, prendi as duas mãos em um varal assassino, machuquei o tornozelo na área de serviço e tive o rosto cortado por uma máquina de costura que desabou da estante. Nestes momentos, seria ótimo ter alguém por perto, tudo poderia ter sido mais grave, de uma maneira que não pudesse resolver sozinha. Mas também percebo a mão de Deus que nunca me deixa só, eu sinto o Seu cuidar, com amor e muito carinho. O meu primeiro pedido na hora da dor é: - Senhor, não permita que eu desmaie. Uma médica disse-me que tenho sangue frio, depois de contar-lhe como agi para estancar o sangue e prestar a mim mesma o primeiro socorro. Devo esse aprendizado aos meus sobrinhos, ajudei minhas irmãs e cunhadas a cuidar deles quando crianças e vivi muitas situações em que meu sangue precisou ser mesmo muito frio. Os filhos chegaram já adolescentes, mas também ensinaram-me a agir com precisão, apesar do desespero do momento, saber o que dizer quando os gêmeos ligam de madrugada porque um deles está com febre alta, socorrer o outro que caiu na escada, a outra que precisa de uma cirurgia. Essas coisas que as mães passam todos os dias mesmo quando o filho já é dono do seu nariz. Quando se tem uma mãe pra chamar, esse é o melhor socorro. Eu chamaria a minha.

Não sou do tipo que aconselha a solidão, é bom pra mim, mas percebo a grande maioria que tem necessidade de outra pessoa por perto, ainda que se sinta só, posto não ser o fato de ter alguém ao lado que nos livre disso. É preciso gostar de si mesmo, de estar bem em sua própria companhia para depois ser companhia para o outro. Muito me entristece ver casais em profunda solidão, apenas os corpos habitam a mesma casa. Isso é a verdadeira solidão.

inalda lima
Enviado por inalda lima em 22/03/2014
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