Quando a resposta é o silêncio, o medo predomina!

Quando a resposta é o silêncio, o medo predomina!

Agora me lembro quando vim morar aqui. Esta cidade era tão simples. A noite havia um lugar comum, onde as pessoas comuns se encontravam. Falávamos de tudo, de todos. Na praça da cidade as tribos, se juntavam para falar sobre futebol, sobre mulheres, enfim para falar sobre o que estava ao nosso alcance (que na época na era tanto).

Já naquele tempo, que nem muito tempo faz (há umas duas décadas) existiam as velhas rixas entre famílias por aqui, porém era algo que não nos diziam respeito, quer dizer se você não fosse de alguma família envolvida no negócio. Porém percebo que os ares não são os mesmos, o clima está ficando cada vez mais quente (nem é por causa do aquecimento global), hoje se fala em gangues, em quadrilhas, puxa como evoluímos! Nossa pacata cidade avançou, progrediu, pena é que Fernando Santos não pode mais satirizar o que hoje vemos. Naquela época em meados de 1994, ainda podíamos caminhar depois das 23:00h com menos preocupação de que alguém estranho, encapuzado ou algum O.M.N.I. (Objeto Motorizado Não Identificado) poderia nos barrar para pedir informação onde ficava a casa de alguém. Mas, é verdade que já havia os “causos”, que vez por outra atemorizavam nossas mentes adolescentes, como por exemplo: “ Alguém viu um homem não identificado andando na Rua da Floresta”, “ Outro bateu na porta da casa de fulaninha meia-noite – devia ser algum trato”, bem as coisas eram mais simples. O medo ainda era natural. As evidências mesmo tímidas não poderiam nos apontar para o quadro atual que vivemos.

Imagino que o nosso torrão vermelho já teve sangue demais derramado, sangue inocente, vítimas que não puderam defender sua vida. É triste, mas já somos estatísticas. Ainda lembro da data de 24 de julho de 2005, noite na qual o jovem Luciano Gomes foi barbaramente assassinado. Estava indo para Patu com os meus colegas da faculdade, quando voltamos após as aulas, fui ver o corpo inerte que jazia no chão de pedra (não menos duro do que o coração daqueles que lhe tiraram a vida), por alguns instantes fiquei inerte também, parecia que a vida era apenas um alvo, que pessoas não valem mais do que algumas balas disparadas, coisas que não têm explicação.

Acredito que hoje temos uma realidade muito difícil de ser alterada. Digo isso mediante a constatação do aumento da falta de perspectivas dos nossos jovens. Estamos diante de uma geração sem sonhos. Geração vulnerável. Muitos são filhos do acaso. Outros não sabem quem são seus pais. Aqueles fatos que foram acontecendo no decorrer desse período, me fizeram refletir bastante. Eu também tive meus “dias de cão”. Todos sabem que fui envolvido com drogas, que fui dependente químico e psicológico, muito mais do que isso, também era viciado em bebidas. Porém Jesus virou essa página da minha vida, me deu outra chance e por isso estou aqui hoje. Se não fosse por Ele, não sei se ainda era.

Bem, retomado o foco da questão, minha constante preocupação é que todo o contexto foi alterado, nossos dias são realidades muito diferentes daquela da minha turma, que se reunia para fumar maconha e ouvir Raul Seixas e Pink Floid. Para dimensionar o problema, ninguém em nossa turma possuía ou usava arma, qualquer que fosse, porém hoje percebo que muitos jovens em nossa cidade andam armados. Isso é inadmissível! Estes mesmo jovens estão adentrando no mundo do álcool e das drogas. Não estudam. Não trabalham. Não existe um suporte social, familiar, educacional, espiritual para que eles sejam despertados para o risco que eles são para nós e para si próprios!

Estamos assistindo a tudo de forma passiva, porque sempre encontraremos alguém para culpar. Podemos pensar que isso não é um problema nosso, que não nos compete pensar, analisar ou pesquisar sobre as causas e conseqüências disso tudo. Até que um dia alguém nosso é atingido. Não por uma bala perdida ou direcionada. Não por isso. Chega o dia que acordamos e damos conta que são os nossos filhos que estão lá, que é o nosso aluno que está envolvido. Daí é muito mais conveniente dizer que já sabíamos que ele iria dá para isso mesmo. Ora, eles são produtos de uma sociedade desajustada, de lares que nunca foram uma família.

Quantos desses não rejeitamos tantas vezes? Quantos não precisaram de uma palavra amiga e esta jamais chegou...vieram então os “outros” amigos, que apoiaram, que incentivaram, que lhes mostraram que a vida é assim mesmo, que não há alternativas, que sonhos são desculpas de quem não tem coragem de agir e fazer acontecer.

Nossa cidade está cheia de violência! Chegamos a esta comprovação porque precisamos ver algum corpo estendido no chão, porque tivemos que enterrar os nossos jovens e os seus sonhos. Mas há algo que nos mostra além dessa consumação. Necessário se faz perceber que a violência tem muitas faces, que ela tem suas várias formas de manifestação.

Após começar a lidar com os jovens de maneira mais concreta (digo, desde que comecei a lecionar no ensino fundamental e médio) pude entender melhor a cosmovisão que eles têm, cheguei a conclusão que eles se encontram sem sonhos, muitos não tem nenhum projeto para o futuro, são vulneráveis em suas emoções, são débeis sobre suas decisões, são alienados sobre o que podem conquistar e como devem fazer para concretizar algo na vida.

Estes jovens não estão preparados para enfrentar um mundo pós-moderno competitivo, exigente, que trata todos como um produto do mercado de trabalho.

Retomando a questão da violência, percebo nas discussões que acontecem em sala de aula que muitos dos nossos educandos não estão aptos a conviverem com opiniões diversas, com pessoas com escolhas próprias, há um vazio existencial que me deixa perplexo! São crises existências que não têm uma explicação plausível para definir. Tenho visto atitudes agressivas, que ultrapassam o limite dos problemas próprios da fase da adolescência. Quero agora citar uma frase que fiz há algum tempo: “A língua é a arma que mais fere..Não deixe ela destruir tudo a sua volta!” Há momentos que o diálogo parece inviável entre eles, mas são apenas adolescentes! Sim, mas precisam ter limites e saberem o que significa tolerância e respeito pelo próximo.

Tenho tentado entender que geração estamos construindo, melhor que escola seria ideal para estes jovens, porém percebo que há muitas coisas envolvidas, que precisamos aprender mais sobre nosso tempo. Vivemos uma época de inversão de valores, são transformações que acontecem de forma tão sutil que só conseguimos sentir os seus efeitos. Não sei exatamente o que podemos fazer para ajudar estes jovens, porém o silêncio, a omissão, talvez seja o nosso maior pecado. È hora de acordarmos e ver o que pode ser feito antes que seja tarde demais. Antes que registremos cenas como a que aconteceu na Virginía, onde muitos universitários foram mortos por aquele rapaz.

Luciano costa. ( Pedagogo)

03/05/2007

Antonio Luciano da
Enviado por Antonio Luciano da em 05/05/2007
Código do texto: T475616