A terrificante visão

A TERRIFICANTE VISÃO
Miguel Carqueija


Há muitos anos — eu teria dez, onze? — estávamos minha mãe e eu visitando uma de suas amigas, a veterinária Dra. Sophia, que morava numa boa residência em rua sem saída do bairro residencial de Grajaú, Rio de Janeiro.
A rua em questão terminava no sopé do morro, com mato à beça, levando sem dúvida á floresta. Como fosse rua fechada e sem trânsito, fiquei algum tempo do lado de fora. Creio que um dos filhos da doutora estava lá também mas, a certa altura, aproximei-me do mato fechado que dava início à encosta.
Por alguma razão fiquei olhando aquele matagal logo à minha frente. E paulatinamente alguma coisa foi surgindo com nitidez naquela escuridão, em meio à pletora vegetal. Subito, compreendi que estava olhando diretamente para uma face, uma boca escancarada em ameaça, uma coisa minaz que lá estava, escondida no mato, imóvel, como à espera. Uma cobra, e venenosa, porque as não venenosas são mansas e fogem.
Lembro que fiquei olhando, num misto de horror e dúvida, e cheguei a dar um passo à frente. Depois caí em mim e me afastei. Mais tarde contei a minha mãe da visão que tivera, e ela acreditou que poderia ser, sim, uma serpente.
Não foi uma visão clara, o mimetismo da mata ocultava a criatura. Mas que mais poderia ser senão uma cobra que, percebendo minha proximidade, armara o bote? Esses animais têm fama de hipnotizar, principalmente os passarinhos.
Animais não possuem maldade, não sabem o que é isso. Mas uma serpente de fauces abertas dá uma grande impressão de crueldade. Nunca esqueci aquele incidente, e a forte impressão de horror causada pela apavorante visão.


Rio de Janeiro, 13 de abril de 2014.