IGNORÂNCIA NÃO GERA DÚVIDA

IGNORÂNCIA NÃO GERA DÚVIDA

Li uma postagem no facebook onde uma pessoa fez uma série de comentários a respeito de a mulher que exerce a presidência do Brasil ser chamada de Presidenta. O discurso sem qualquer fundamento teórico e técnico é exemplo típico das porcarias e besteiras que se escreve nesse tipo de aplicativo por pessoas que não têm o menor conhecimento sobre os assuntos que se propõem a escrever. Pior, que outras pessoas com grau mais elevado de idiotice, além de endossar as besteiras, ousam incrementar as baboseiras com anticultura.

Na postagem, a pessoa fazia uma série de comparações entre substantivos tentando convencer que a mulher não poderia ser chamada de Presidenta, denotando puro preconceito (é difícil para alguns aceitar a ascensão delas na sociedade). Se pensasse só um pouquinho, lembraria que a governante de um estado é Governadora, de um município é Prefeita. Existem Deputadas, Senadoras, Vereadoras, etc. Por que não Presidenta?

Mulher não! Ela é a Presidente só porque está presidindo... Pensamento machista. Faz-me lembrar de que antigamente existia a função de governanta – mulher, empregada, que administrava a casa do patrão. Não poderia ser governante, sinônimo de um gênero. Naquela época, jamais se pensaria que a mulher provocaria toda essa revolução social e dominaria o mercado de trabalho em quase todas as áreas: médica, educacional, moda, etc.

Apesar de toda evolução e ascensão da mulher, que deixou de ser dona de casa e está conseguindo inverter os papéis, permanece o pensamento machista e discriminatório como o racista que persiste até hoje. Ou será inveja? Algumas mulheres deveriam mesmo continuar servindo ao homem, inclusive na cama, pois nem devem conhecer a sensação de liberdade e de individualidade que promove o orgasmo.

Para reforçar o caráter preconceituoso da postagem, a ela deu menor valor, pelo aspecto cultural, um comentário de outra mulher dizendo que o Aurélio (Buarque de Holanda) “deve estar se revirando no túmulo” (sic) pela intenção de se utilizar o termo Presidenta.

Será que a ignorância é incapaz de deixar o indivíduo em dúvida? É assim, pronto e acabou? Elas foram tão peremptórias que me fizeram concluir que ignorância não gera dúvidas.

Se o Aurélio pudesse fazer qualquer movimento depois de morto, até porque deixou de ser alguém, faria, sim, gestos obscenos para pessoas sem cultura quando a ele se referissem escrevendo idiotices. Imagine o trabalho necessário para se elaborar um dicionário: a compilação de palavras que caíram em desuso, a atualização necessária e a inclusão de palavras novas incorporadas ao vocabulário, tanto pelo regionalismo e uso de gírias, quanto pelo estrangeirismo por conta do fenômeno da globalização. Árduo, sem dúvida, não é?

Lamentavelmente, a pessoa que teve a infelicidade de ao Aurélio se referir, nem pensou em consultar o dicionário, fruto de seu trabalho. Pelo nível nem deve ser adepta de leitura e, provavelmente, nem tenha um em casa para conferir se a sua afirmação tem fundamento.

Aqueles que endossam, compartilham e, em burricada, adicionam idiotices em aplicativos na internet, deveriam, antes, instruir-se, a fim de não declarar publicamente a sua condição, pois consta na página 1704 do Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa a definição de Presidenta.

Dicionário é ferramenta útil, serve para tirar dúvidas e não é vergonha utilizá-lo, ao contrário, mostra que a pessoa tem interesse em escrever corretamente e sempre aprende mais um pouco. Ainda que não tenha um exemplar em casa, está ao alcance de quem está “on line”, como é o caso, vários dicionários digitais facilmente acessíveis: Michaelis, Dicio, Caldas Aulete, Houaiss, o Priberam, de Portugal... Wikipédia não vale, porque qualquer um escreve o que quer sem sobre qualquer assunto, sem o menor comprometimento intelectual, e muitas vezes sem fundamento. Em todos constam a definição de Presidenta que, aliás, também é encontrada no VOLP (Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa) da Academia Brasileira de Letras.

LIVRO NÃO É ENFEITE DE PRATELEIRA